NOMES imPRÓPRIOS

Dia destes, lendo um jornal, deparei-me com uma notícia policial, nominando um tal de Tadeu Hirsuto (hirsuto - provido de pelos ou cabelos longos, duros e grossos; cerdoso), e estava certo de que, na foto ilustrativa veria um peludão mal encarado, mas o que vi foi sujeito magrinho, pequeno, careca, que parecia não ter nem pestana. Olhando aquela figura, qualquer um seria levado a supor que o cidadão talvez nem possuísse pelos pubianos, pela brancura característica.

O caso trouxe-me à lembrança certas bizarrices familiares, que já provocaram muitas risadas e algum constrangimento.

Todos sabemos que os nomes escolhidos pelos pais para seus filhos, costumam não ser bem aceitos por alguns (não poucos), e excetuando-se a simples antipatia, há diversos casos em que a coisa fica confusa e vexatória. Como exemplo impessoal, temos uma piada antiga, em que o vivente pede a um juiz a troca de seu nome. O magistrado lhe passa extenso sermão, explicando que isso é procedimento sério e grave, exigindo trâmite demorado, mas quer saber seu nome. José Bosta! Chocado, diz que o caso merece apressamento, e lhe pergunta como deseja se chamar, dali pra frente. João Bosta! O José é que incomodava.

Um tio bisavô, já falecido há muito, vivia em pequena cidade do interior de Goiás, e se chamava (acreditem) Antonio Caio Brochado. Minha tia bisavó, sua esposa, deveria se chamar Sibila Cantante, pelo enredo desfiado por familiares, mas foi registrada como Shibila Matante, e os gozadores de ocasião não perdiam a chance de criar as anedotas mais infames a respeito. No entanto, o tio Brochado era o garanhão-mor do lugar, e a Shibila Matante trouxe à vida mais de dez crianças (não lembro o número exato), merecendo ser chamada de Shibila criadoira.

Esse casal iniciou uma série de confusas e insólitas nominações, que se seguiram, geração a geração, até os dias de hoje, gerando antíteses (qualquer contraste muito nítido), paradoxos (aparente falta de nexo ou de lógica), contradições, e que se iniciaram com um tio avô, que ao invés de Gregório, chamou-se (por erro) Gregário (gregário - que faz parte de rebanho, muito sociável), mas era um verdadeiro ermitão, recluso, bicho do mato, que nem sei como se casou com tia Solita (que em espanhol quer dizer sozinha), uma festeira, que não parava em casa, nem para cuidar dos seis filhos.

Um deles, aliás, de nome Benigno, virou bandido, coisa ruim, e após várias temporadas na cadeia, acabou indo desta para a melhor (ou pior, se há justiça divina). Outro (e sei que não vão acreditar) se chamava Bizarro Matrimônio das Dores, que, obviamente, tinha de encontrar uma Jovelina Pomboca Cheirosa, e gerar uma filha, chamada Pombinha Benvinda.

Desse bando esquisito, surgiu um primo a quem quis muito bem, e que também já se tornou etéreo, indo encorpar o exército de anjos do Criador. Seu nome: Cornélio Pacífico dos Anjos. Passou a infância e adolescência fugindo das zombarias ou evitando se apresentar, onde quer que fosse. Criou até um nome fantasia: Zé Quirino. Mudou-se para outra cidade, e lá conheceu uma Zézinha (coincidência, né?), e só depois de, perdidamente, apaixonado pela moçoila, e já na antessala do altar matrimonial, é que soube que a menina usava da mesma estratégia sua, e que seu verdadeiro nome era Libertina dos Prazeres. Engoliu e casou.

Nesse caso específico, tenho de admitir que os nomes de ambos tinham razão de ser.

O primo Cornélio, corneliou durante toda sua vida conjugal, fingindo sempre não saber de nada e criando sete filhos, que nada tinham em comum com seus traços fisionômicos (um era bem mulatinho, parecido com o padrinho escolhido pela mãe). Como era vendedor viajante e se ausentava, continuamente, de casa, dava margem a que a prima Tina voejasse ao sabor do vento, e vento é que não faltava naquela casa, tal a multidão que entrava e saía, sempre.

O que não citei ainda é que dos sete filhos, seis eram meninas, e só um menino.

Quando o casal se separou, após anos de bagunças e desentendimento, as filhas foram com a mãe, e eu soube que abriram um próspero negócio em outras paragens, mas preferi não me inteirar do ramo de atividade. O único filho preferiu a companhia do pai, e eram muito bons companheiros, até que o garoto decidiu seguir um caminho diferente.

Pra variar, esse rapaz, que deveria se chamar Mateus Anacleto, foi registrado por sua mãe, pra lá de bêbada, como Ateu Completo, e na última oportunidade em que estive com os dois (pai e filho), assisti à cerimônia em que, creio, pela primeira vez, um ateu era ordenado padre. O padre Ateu Completo, devoto de uma santa ordem. Mistérios da fé!

nuno andrada
Enviado por nuno andrada em 02/02/2019
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