perplexidade

«Não sei se estou triste?», a frase baila querendo ser ideia, ficando parecida com uma hesitação. Não chegar a ser ideia, seria - tê-la escrito sem pensar, acho que é - isso que aconteceu. Agora tento remediar, mas é como um remendo para um furo sem que eu saiba ao certo onde ele está. Um furo metafórico, uma notícia que já foi dada, só não sei ao certo a que corresponde. Neste momento tomo consciência de tudo, deveria pois saber dizer o que descobri, é o que vou tentar.

O personagem da história, imaginemos isto como um conto onde estamos todos, todos leitores, à procura de descobrir se ele está triste. Para isso somos obrigados a pensar pela nossa cabeça, já que ele, ainda não tendo decidido, nos obriga a pensar se é possível estar triste enquanto se pensa se estamos ou não tristes.

Damos conta de ser uma situação relativamente estranha, geralmente ninguém pensa se está triste. Será isto dizer que é costume saber o que sentimos, não se tratando dum pensamento, pois tratar-se-á duma sensação. O que é que acontece quando tentamos transformar uma sensação numa questão pensada será uma ideia, virá capaz de gerar sensações novas.

Perplexidade: «Adoraria chamar a este conto "perplexidade"!». O nosso personagem não decide a dúvida, mas parece dar-nos agora uma certeza, o que de certo modo já vem compensar-nos do esforço de estarmos a tentar seguir os seus pensamentos e perceber que sensações vamos sentindo. Isto põe em evidência a dificuldade de nos identificarmos com o personagem, ele é, de algum modo, o narrador do que seja esta narrativa?

Precisamos de sair destes meandros psicológicos, descobrir um final. Não necessariamente lógico, um desfecho onde finalmente se torne nítido um fio condutor, obtendo para o mesmo uma conclusão. Neste momento o personagem sabe o que sabia desde o principio mas não podia dizer, enquanto hesitante fosse exercitando o pensamento: pensar é um modo de sentir que nunca nos deixa tristes desde que nos dê uma solução, nem que essa solução seja triste.

Se pensarmos que chegámos a uma solução não ficaremos tristes de ter tido dúvida sobre se o personagem estaria ou não triste, vamos pensar que sim. Ninguém pensa se estará triste se não lhe ocorrer pelo menos essa ideia, o que deve ser triste já que não é uma ideia alegre. Porém, no final da história, parece que não terá passado dum exercício dialéctico: sim ou não?

{Mais um exercício literário vindo da vida que é cheia de perplexidades e indo para a ficção onde se fixa, ou tenta fixar, essa feição que nos contempla com o rosto do enigma.}

Francisco Coimbra
Enviado por Francisco Coimbra em 18/09/2007
Código do texto: T657481