Moldura

Eu só queria emoldurar um Momento...

Me disseram uma vez que a moldura era mais bonita que a pintura, que no destaque das paralelas que remontavam o retângulo, é que estava o segredo da obra, sem isso, a arte seria uma mancha na parede, mas moldura transformou a mancha em arte.

Eu penso em molduras, vejo a memória como uma infinita parede de galeria, onde cada quadro remonta minhas lembranças especiais.

Eu só Queria emoldurar um momento.

Não como uma foto, ou pintura, queria que os cinco sentidos pudessem ser exprimidos, que ao me deparar, pudesse sentir o cheiro, ouvir, ver, e que o gosto daquela atmosfera capaz de vir a boca, não apenas uma imagem colada em duas dimensões, que fosse possível perambular por aquele instante, e ver a expressão do rosto, sentir arrepios sobre o êxtase orgástico.

Que a legenda conseguisse conter a sensação transcrita em palavras, e ao decodificá-la, nos remetesse completude, de modo que o mais leigo compreenderia sua sublimidade.

Talvez ir mais além, compilar numa só moldura, o infinito de todas as ações naquele instante, o momento exato de uma estrela que morreu sozinha, cujo o brilho nunca chegará, na vastidão do silêncio ruidoso do espaço, se dissipará no esquecimento.

Capturar cada partícula em reações subatômicas, a semente que não germinou, o ato impedido e o ato consumado, a dor alheia, o choro em silêncio, todas as coisas não ditas, a espera em vão, o desencontro pelo acaso, o vir a ser e o que não será, a sucessão dos dias seguintes,a solidão da morte, e o tempo que lentamente dissolve deixando algo no lugar, o nada em que o eterno flutua, o início apoteótico e o final irrevogável de tudo que existe.

Uma moldura capaz de abraçar o universo pensado como um só ser, nascendo e morrendo sucessivamente em diversos pontos na sua magnitude, fria e quente, calma e caótica, confusa e simples.

Por que nada que houve naquele instante, pode ser considerado indigno de ser emoldurado.

Eu só queria emoldurar um momento...