Conto de Natal

Os homens vinham cansados, desanimados, calados. Haviam esperado o dia todo o encarregado da "Frente de Serviço" para receberem seus salários. O pagamento não havia chegado. Não tinham almoçado, estavam apenas com o café da manhã. Ao serem informados que o dinheiro não chegara, eles não reclamaram. Baixaram a cabeça, decepcionados. Estavam acostumados à injustiçam às humilhações, `s incompreensões. Esta era apenas mais uma gota d'água insuficiente para transbordar o pote da paciência deles. Só lamentavam ser véspera de Natal e eles não terem dinheiro para comprar comida. Severino, o mais moço deles, era o mais triste: a mulher estava prestes a descansar e ele não poderia comprar nada para o filho que ia nascer.

Mas aqueles homens simples e acostumados a sofrer, não desesperavam. Engoliam em seco a injustiça e conformavam-se com ela, embora ficassem com um travo nas gargantas. Eles acreditavam que um dia seriam recompensados pelos sofrimentos. Não se envergonhavam se ser pobres. Para eles, havia algo superior à maldade humana. Eles acreditavam no milagre da vida e achavam que a criatura humana, apesar dos pesares, ainda era viável. Mesmo aquela seca inclemente que assolava a região não era capaz de abalar a sua fé em Deus. Em verdade, o grande patrimônio deles era a Fé; sem ela que lhes restaria?

Quando atravessaram a ponte que separava a cidade da plantação onde moravam, era meia-noite. Os homens apressaram os passos. Queriam chegar logo aos seus casebres. Nisso, sem que houvesse qualquer prenúncio, a noite começou a ser iluminada por relâmpagos e trovões começaram a ecoar no céu, iniciando a festa que mais alegra o homem do campo e assusta o da cidade. Então aqueles homens intuíram que Deus ia ajudá-los, mandando chuva. As lágrimas rolaram nas suas faces marcadas pelo sofrimento. A chuva começou a cair. Aí eles pararam a caminhada e, todos de joelhos, rezaram. Depois, prosseguiram a marcha, debaixo de chuva. em direção `s suas humildes moradas.

Ao chegarem, grande já era o numero de pessoas ali por perto. Na frente da casa de Severino muita gente rezava, ria, chorava, dava graças a Deus. Os homens foram se aproximando, sem aparentar nenhuma curiosidade, com os semblantes tranquilos. Sabiam e isso lhes bastava: havia acontecido uma vontade de Deus. A chuva era uma benção divina, um presente de Natal.

Severino entrou na sua casinha. Ali, num berço feito de um caixote de sabão, enrolado nuns trapinhos, iluminado pelos clarões do céu, estava um menino, seu filho. Nascido como Jesus, num mesmo lar humilde, quase uma manjedoura. Severino pegou a criança nos braços e a alegria que sentiu foi bastante para fazê-lo esquecer todas as injustiças do undo. Segurando o menino, ele compreendia que se um dia Cristo voltasse a Terra, seria num lar como o seu, exatamente como nascera seu filho: sem nenhuma mordomia, sem assistência médica, sem nenhum cuidado especial, mas cercado, louvado e amado pelo verdadeiro povo de Deus, os CAMPONESES. Inté.

P.S. Esta maltraçada é de 1982

Dartagnan Ferraz
Enviado por Dartagnan Ferraz em 01/05/2019
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