Dona Cecília, benzedeira

O silêncio toma conta da pequena sala. Todos guardam com respeito os momentos em que dona Cecília realiza seus rituais mágicos. Compenetrada e tranqüila ao mesmo tempo, movimenta as mãos, faz gestos incompreensíveis, repete baixinho palavras que ninguém consegue decifrar. Reza, abençoa. É benzedeira.

Cecília da Costa Neves era apenas uma menina, mal entendia direito esse mundo quando um padre, tio de sua mãe, entregou-lhe um livro de orações. Ao fazer isso, atribuiu-lhe uma missão que a acompanhará até o último dos seus dias: a missão de afastar coisas ruins das crianças, acabando com a choradeira, a falta de apetite e de sono.

Nunca reclamou de largar o descanso ou adiar a conversa com os netos para atender quem chega. A mãe desesperada, que vem em busca do alívio para o filho e para si, não pode esperar.

La vai dona Cecília, mais uma vez. Hoje, aos 80 anos de idade, já perdeu as contas de quantas crianças benzeu nos últimos 69 anos. Milhares, com certeza, pois até hoje forma-se fila em frente à sua porta. Vem gente de todos os cantos de Santos, até de São Paulo: uma média de 50 por dia.

-- "Não sou eu quem cura. É Deus", diz dona Cecília, com muita tranqüilidade.

Que mistério será esse que cerca as benzedeiras? Nem dona Cecília sabe. Só tem certeza de um a coisa: quando estiver para morrer, vai ter um sinal. Então, ensinará as rezas para alguém.

E a tradição de se benzer crianças se perpetuará por novas gerações.