Caminhando

 
Estava caminhando numa estrada em meio de uma mata. Era estreita e de chão batido com imensas árvores entrelaçadas umas com as outras formando um natural verde túnel. Apesar das sombras que elas faziam, o sol ardia nas costas de tão quente que estava. Alguns passantes encontravam-se, mas mal olhavam-se uns com os outros, nem sequer se apercebiam.

Andávamos lentos, absortos e cabisbaixos, sem saber para onde aquele caminho iria nos levar. Ao meu lado, foi se aproximando uma mulher que permaneceu no mesmo ritmo em que eu estava andando. Ficamos caladas e num mesmo compasso prosseguíamos sem nos questionarmos quem éramos e para onde iríamos. Simplesmente arrastávamos os pés vagarosamente, sem saber onde aquela estrada iria dar.

Num repente passou uma condução motorizada, que não sei definir qual era o tipo daquele veículo. Meio aberto e com pouco espaço, totalmente diferente dos automóveis convencionais. Fiz sinal para conseguir uma carona, pois já estava me esvaindo de cansaço e com muita sede. O carro parou, percebi que havia um casal sentado nos bancos da frente. Então mandaram que nós subíssemos uma de cada lado para equilibrar o peso. Eu subi e me segurei nos ferros que havia ao lado, enquanto que a mulher que subiu comigo acabou caindo da condução e ali inerte ela permaneceu.

Eles não se importaram com a queda da desconhecida mulher e tocaram adiante sem olhar para trás. Não adiantou meus argumentos para que parassem, simplesmente deixaram-na. Eu, como estava de carona e sem saber para onde eles iriam, fechei os olhos e me calei, tampouco me importei com o destino que estava tomando, só queria chegar em algum lugar…

Foi então que chegamos num local bem atípico. Poucas casas e com um volume de água fora do normal nos arredores das casas. Tanto que a maioria das residências eram barcas. E as pessoas moravam nas galés destes. Eram barcos grandes e daqueles bem antigos. Outro fato extremamente curioso, eram as diferentes etnias que viviam naquele lugar. Achei muito estranho, falavam idiomas diferentes e suas fisionomias bem diversificadas umas das outras. Totalmente heterogêneas. Enquanto eu estava tentando me identificar com alguém para me instalar, em qualquer canto que fosse, pois naquele momento eu só desejava descansar…

Nesse instante foi se aproximando um homem altivo e forte, uma fala imponente, cabelos e barba bem aparados, com um trajar arrojado todo de couro e com longas botas pretas era como se ele fosse um guardião templário. Falou num tom rude e em alta voz para o casal que me deu carona: os volumes das águas estão acima do normal, tem algo de errado. Temos que averiguar qual é causa disto. E ordenou para que eles e algumas outras pessoas que ali moravam se juntassem e fossem investigar a causa da anormalidade. Estava ele tão preocupado que nem percebeu minha presença. Aproveitei o desfecho, fechei meus olhos e adormeci.

Não sei quanto tempo permaneci adormecida. Acordei com barulhos estranhos de águas e falas que eu não entendia nada, eram pessoas desconhecidas para mim e com idiomas diferentes. Neste interim chegou um barco não muito grande, pessoas que foram se juntando de vários lugares e acabam chegando ali, como eu. Estes também queriam se instalar em algum lugar seguro.

Instantaneamente alguém sinalizou para uma pessoa que pude definir como sendo um governante da indefinida cidade. E este ordenou que levassem água e comida para aquelas pessoas que estavam chegando e alojadas nos porões dos barcos. Logo em seguida ele foi ao encontro do grupo para verificar o volume de pessoas que haviam chegado e foi logo dizendo: impossível a permanência de quem quer que seja aqui. Em virtude de que a lotação já está no limite e as águas estão subindo, por essa razão, e a produtividade está abaixo do necessário para a sustentabilidade da cidade, não temos acomodações para todos neste lugar. Disse ele.

O desespero foi grande daquelas pessoas, inclusive a minha, pois também estava sendo inconveniente a minha estadia ali. Todos nós não tínhamos mais para onde ir, já havíamos passado por vários lugares e sido rejeitados.

Foi então que, desesperadamente, todos começaram a falar e a dizer por que estavam ali e que tinham poucos dotes, mas que possuíam várias habilidades e que muito poderiam contribuir para o desenvolvimento daquele lugar. Caso o Governante permitisse a permanência deles, ali.

Então começaram a argumentar e a demonstrar suas habilidades, tirando as suas poucas bagagens e alguns poucos recursos que tinham trazido. Havia uma família de dançarinos, uma de cozinheiros que sabiam fazer verdadeiras especiarias na culinária. Um senhor com uma longa barba que trazia vários cachorrinhos de raça e que ele iria adestrá-los para serem bons amigos dos homens, um casal de médicos com mudas de plantas medicinais e a sabedoria para produzirem muitos remédios, um casal de mestres nas letras, outros iriam edificar casas e alojamentos adequados ao local, e assim por diante… Cada um com suas sabedorias específicas…

Diante disso, o governante ficou tão impressionado com as iniciativas e as disponibilidades deles em demonstrarem suas artes e o que poderiam fazer para evolução da cidade, que não teve outro jeito senão aceitá-los.

Eu, como estava só observando, e receosa de que também pudessem me expulsar dali, lembrei que sabia cuidar muito bem de crianças e prontifiquei-me para cuidar delas enquanto os pais trabalhavam. E fui logo montando um lugar apropriado e tentando ensinar o que sabia para elas.

Iniciando pela relevância de ensinar-lhes algo que fosse favorável para elas e a coletividade, no sentido de que quanto mais aperfeiçoamento em algumas atividades especificas elas tiverem, mais possibilidades e probabilidades de contribuição para garantir e assegurar um lugar nas sociedades e vivendo em harmonia com outras pessoas.