DESRESPEITO HUMANO

Não era assim t ã o idosa, perto de sessenta anos, mas quebrou uma perna, cirurgia complicada e resultou em enorme dificuldade para se locomover. Tempo do bonde, anos 50. Aposentada. Assinou procuração para uma filha que recebia o dinheiro, repartição INPS, entregava tudo na mão da mãe, conferindo tostão por tostão - despesas médicas, roupa/calçado quando necessário, frutas. Morava com um filho solteiro, mas este faleceu e solução prática foi residir com a filha honesta. Anos passando, "idosou-se"... Parentada sempre acha que o aposentado é um idiota cujo dinheiro é para ser dividido com quem nunca inventou precisar 'esmolinha' antes. Tornou-se rotina. Quando a filha mais velha aparecia no subúrbio distante, previsível extorsão. Não dava outra. Dinheiro para um cunhado, coitado, comprar camisa, cueca, pijama. A fulana aparecia tempos depois, além da data combinada para devolução, sem o dinheiro porque... "Fulano' ia pagar", mas aí........ aí era o dinheiro ter sido passado para um sobrinho desse tio, necessitado de macacão para o trabalho... e na outra ocasião era um primo, o marido da filha, um agregado qualquer. E diziam cinicamente: "Para que dona LUCINDA quer dinheiro se ela não sai de casa?" Ou seja, o idoso não se veste, pé no chão, não come, não bebe, não lê jornal, não recebe atendimento médico (Alzheimer ainda era palavra desconhecida - se fosse popular, ela seria acusada erroneamente de não raciocinar, ignorar estar "emprestando" praticamente à revelia). Um dia, estouro apoteótico, negou, foi acusada de egoísta.........

Comum em várias famílias.

Famílias ou um mero agrupamento meio genético, meio social???

Na atualidade, a neta acaba de fazer 80 anos, não tem filhos. Onde reside, uma familiar acha excessivo que ela possua um freezer, "dar a alguém com 4 pessoas em casa...", ela fingiu não perceber a insinuação - não doou... - há quem tenha pretendido 'vender' louça antiga, relíquia de aparelho de chá inglês e aparelhinho dourado do século XIX num antiquário tradicional e pedir comissão que por certo seria de... 99% (indignada, ela doou no niver das duas diretoras de escola com quem trabalhara 10 anos antes) - outro pede empréstimo bancário para a compra de um carro, "depositaria" mensalidade na conta-corrente, segundo carro, terceiro... ou a imaginária fantasia de montar um comércio, já o terceiro falido. Extorsão, sim, pouco diferente, mas na realidade a mesma intenção nefasta. É sadia, mente aberta, pensão + aposentadoria, minha professora on line de Letras, assumida sócia literária.

E ninguém aceita serenamente recusas e ajuste existenciais. Ela não perdoa gente que só sabe esticar a mão........

F I M

Rubemar Alves
Enviado por Rubemar Alves em 07/10/2019
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