A DIFÍCIL ARTE DA MORTE - PARTE 02

Depois da infame notícia, ela passou a agir como um robô, sem expressar qualquer tipo de sentimentos. Não sentia mais o doce sabor de viver.

Fé? Que fé? Está palavra estava excluída do seu vocabulário. Deu um tempo a Deus, afinal, ele a abandonou, pois, iria tirar dela, o que tinha de mais precioso, a sua mãe.

Saía para trabalhar, mas, não se comunicava com ninguém, ficava só lá, no canto de sua mesa, fazendo suas tarefas de forma automática, se recusava a se entrosar.

Os colegas bem que tentavam, mas, o seu olha distante e mareado, não abria espaço para nada.

Vendo aquela situação, os colegas foram aos poucos abrindo espaço para ela, para tentar que ela tivesse seu próprio tempo.

Todo final de tarde, retornava para a sua casa, e só se encostava na cama, e lá ficava a chorar.

Não se alimentava, não fazia mais nada, só sobrevivia.

Certo dia, estava ela lá, no escuro do seu quarto, entre as suas lágrimas e lençóis, quando o celular tocou. Ela não deu importância, mas, ele continuava a tocar e a tocar insistentemente, até que ela resolveu olhar, e viu que era a sua mãe quem estava ligando, então, ela atendeu, e foi logo dizendo:

- Mãe, aconteceu algo? – Sua voz saiu em um grande desespero.

E a mãe, com aquela calma de sempre, e com a voz pausada, respondeu:

- Sim, aconteceu?

Ela pulou da cama com o susto e perguntou gritando em desespero:

- O que foi mãe? Está passando mal? Diga logo, por favor!

E a mãe, com sua eterna calmaria respondeu:

- Aconteceu você filha! Desde que foi ao médico comigo, sumiu. Não me procura, não me liga. O que está acontecendo?

E de repente, ela caiu em si. Estava tão preocupada com a sua decepção, por saber que a mãe tinha uma doença incurável e que em breve partiria para o outro plano, que esquecera de ficar com ela, e só estava sendo egoísta, pensando só nela mesma.

Uma sombra de vergonha caiu sobre ela, e sentiu aquela adaga fina e perfurante penetrando em seu coração de uma forma lenta e dolorosa. E sentando-se, respondeu:

- Desculpa mãe! Estava tão envolvida com os meus próprios sentimentos, que esqueci que a verdadeira vítima é a senhora, e não eu. Vou aí agora mesmo. Sinto muito.

A senhora idosa e simpática respondeu sem tristezas na voz:

- Não sou vítima minha filha. Deus me deu uma vida maravilhosa, com um bom marido, excelentes filhos, e nunca deixou que nos faltasse nada. Só tenho a agradecer a ele. Mas, todos temos um tempo nesse mundo, não nascemos para ser eternos. E a morte é algo natural, embora, nós, seres humanos, tenhamos muita dificuldade em compreender e aceitar isso, talvez por causa dos vínculos que criamos com as pessoas a nossa volta. Mas, Deus foi muito bondoso comigo, só que agora, estou prestes a partir e ir morar ao lado dele, pois já cumpri minha missão por aqui. Não é que eu queira ir, mas, não podemos ir contra os desígnios dele. E pelo menos, ele me deu mais um tempo para poder curtir as pessoas que amo, e que estão tão próximas de mim. Porque, seria bem pior se ele só me levasse, sem nenhum aviso prévio, mas, não, ele avisou antes, para que eu possa ficar com todos vocês mais um pouco. Estou te esperando. Tchau. E desligou.

Ela sentou-se na cama, com as lágrimas descendo sem parar, e viu quanto tempo já tinha perdido longe da sua mãe, só se lamentando e chorando. E mais do que imediatamente, ela se ajeitou e pegou o carro para ir à casa da mãe. Nunca havia notado o quanto era egoísta.

Noélia Alves Nobre
Enviado por Noélia Alves Nobre em 11/10/2019
Reeditado em 11/10/2019
Código do texto: T6766605
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