Admoestação severa

Ela bateu com as mãos na mesa. Crispou os olhos, fuzilando-me. Cuspia na minha cara toda a sorte de injúrias. Queria que eu lhe desse alguma satisfação sobre os procedimentos do trabalho, os quais, pelo visto, não saíram como esperava. Tentei justificar as falhas, mas não permitiu que eu iniciasse uma explicação. Bateu novamente na mesa. Achei que o móvel viria abaixo. O escritório todo tremia. Decidi calar-me. Mas dentro de mim, facas estavam apontadas para aquela mulher, assim bem no coração. Bastava que eu desabotoasse a camisa de cetim para que as lâminas reluzissem. Eu daria pequenas estocadas e, por fim, o golpe final. Riria depois da sua perpétua mudez. Certamente cabeças repousariam sobre o biombo. Os curiosos ficariam sem dúvida assombrados: nunca lhes teria passado pela idéia que o sangue daquela mulher fosse tão negro e espesso. Eu ficaria por ali mesmo à espera de aplausos. Era final de tarde e ouvir aquela palestra me havia feito recolher às pressas o bom-humor trazido logo pela manhã. Ao cabo de mais uns minutos, levantei-me sem pedir licença. Ela já havia encerrado a tortura e agora dormia sobre a fatalidade deixada pelo meu ódio.

Tom Lazarus
Enviado por Tom Lazarus em 03/10/2007
Reeditado em 30/10/2007
Código do texto: T678937
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