Um Causo De Um Casal Díspar (1ª parte)

Era uma vez, uma história que não ocorreu há muito tempo e em um lugar não tão distante. Bem, para ser mais exata, se passa em solo baiano. A história fala sobre um casal: Folayan e Isabella. Não eram príncipes, não eram importantes e essa história passou até desapercebida. Porque histórias como essa são muito normais para serem notadas.

Folayan era de origem africana, era pobre e tinha a pele escura, ambas as características fruto das suas raízes. Isabella nem era baiana, estava ali porque o pai vivia dos negócios e havia mudado de localidade em prol das finanças. Era das bandas do Sul e tinha traços italianos que se harmonizavam em seu chamativo semblante.

E na própria Bahia eles se viram. Eu minto! A princípio, Folayan em seu labor diário, notou a jovem charmosa. Ela não o viu, estava ocupada pensando no que o seu espírito jovem enfrentaria numa nova jornada não tão complexa para os pobres e oprimidos, mas até complexa para quem não enfrenta os problemas sociais. Então, até agora parece um causo do século XIX. Vou situar vocês: é um causo moderno.

Folayan trabalhava em uma loja de conveniências, não frequentava ensino superior, porque sendo pobre e de uma família de 5 filhos, ele e a irmã mais velha não tiveram muitas escolhas. Bem em frente a lojinha de conveniências, ficava um belo prédio que compreendia a faculdade de direito. Notem que a cordialidade racial que tanto é motivo de orgulho no Brasil está até aqui presente, etnias diferentes vivendo no mesmo bairro! Pena que não frequentando o mesmo espaço da mesma forma! Adivinha quem ali estudava? A moça bem de vida que Folayan já tinha observado algumas vezes.

Demorou muito para que Isabella notasse Folayan, tal encontro díspar, não só porque a cordialidade das raças é papo furado em território brasileiro, mas porque pobre e rico não se misturam, só ocorreu quando de maneira abrupta, a jovem Isabella foi assaltada ao anoitecer na saída do prédio. Entre as pessoas que ali estavam para acudi-la, encontrava-se Folayan.

Isabella pôde naquele momento notar a feição de Folayan, que não chamou sua atenção, afinal ela acabara de sofrer um assalto, mas pôde notar uma chave na mão dele. Provavelmente a moto comum que estava estacionada do outro lado deveria ser daquele rapaz.

Ela, ainda desolada, estava com o telefone de algum desconhecido ligando para seus pais para avisar do agouro que lhe ocorrera. Folayan ficou ali próximo, afinal seu turno já tinha acabado, podia fazer companhia a donzela. É evidente que Isabella notou a preocupação do estranho e ambos começaram a trocar algumas informações sobre suas vidas. Aquele bate-papo que acontece em todo canto. Uma vida negra e pobre e uma vida branca, cheia de problemas... brancos.

Folayan apresentou-se como Marcos, seu primeiro nome. Não ia citar o segundo, que remetia a suas origens. Primeiro porque Isabella teria dificuldade em aprendê-lo, segundo porque ela nem entenderia o peso étnico que esse nome tão complexo e único carregava. Não valia a pena. Decerto, ali nasceu uma certa amizade. Isabella passou a notar o jovem da lojinha que a ajudou depois do roubo.

E na amizade conveniente, surgiu uma simpatia que logo virou admiração, afinal, tinham algumas coisas em comum. Suas conversas fluíam tão bem, que uma vez Follayan contou como foi quando sua irmã quebrou a perna e toda a demora que enfrentaram no pronto-socorro para que a garota fosse atendida, Isabella até compadeceu-se com a situação, pois quando a mãe tivera crises de apendicite, o médico havia dito que se demorassem mais para recorrer ao hospital, o quadro poderia ter sido fatal.

Não eram histórias tão parecidas as que eles compartilhavam, Isabella tinha problemas bem diferentes dos de Folayan, mas quando unidos em uma conversa, tudo parecia igual. É isso aí que é a paixão... Ela faz você pensar que tudo gira em torno do outro e que o que importa para ele, importa igual para você, mesmo quando em momentos tão distintos. Que nada! Não era a felicidade que seguraria aquele casal.