O espelho
A encomenda chega com seus alaridos clássicos. Com hot dog, ficou primorosa. Quando a mulher com estranhos pensamentos pegou o espelho, era inevitável esconder os olhares gordurosos. A criança não entendeu tanta euforia. O refrigerante esquentou. Passados os minutos e dias, já sentia-se o odor de salsicha estragada. E como vizinhos compartilham mais do que pedaços de terreno, a casa foi invadida. A criança dormindo. Tudo parado. Empoeirado. Quanto tempo a empregada não vinha?
Ao entrarem nas cortinas da particularidade da família de dois membros, tem-se aquela pintura digna de desenhos mal feitos. A mulher. A cara torcida. O aspecto de loucura. O espelho. O chão com o espelho. O ar com gritos de pavor e histeria...
-Ok! Por hoje é o fim ! Obrigado, pessoal!
Mais um dia encerrado na gravação do que, dizem nos bueiros do cinema, há de ser a obra máxima do terror aqui da nossa terra de múltiplas cores, obviamente prevalecendo o verde e amarelo. O diretor H.C. Rodrigues comprou os direitos de um tal livro, com ideias de Stephen King com Os Trapalhões dos anos dourados: O espelho.
Naquela sexta-feira, todos para suas diversões estáticas. O filme que nos mostrará um espelho a demonstrar o inconsciente de seus acéfalos observadores... Sustos. Noite com chuva, aquela trama arroz com macarrão de nossos tempos. E uma moral que deixaria La Fontaine animalesco.
H.C. ao chegar em sua desmerecida casa, teve um click em seus neurônios: esquecera o smartphone no set de filmagem. E muito simples seria criar vida em Vênus a passar um fim de semana sem conexão com a nossa futilidade cotidiana.
E nosso diretor, que num futuro próximo abraçará um fracasso digno de quem investe tempo nos livros da fossa literária, retorna em busca do seu dispositivo. Com certeza eu faria o mesmo.
Ao colocar seu corpo no set de filmagem, o pano negro do desconhecido desceu sobre a mente do H. C. Talvez o filme espelhe a personalidade do diretor.
Sábado e domingo em procura pelo futuro King Kong do cinema. Mas somente na segunda-feira, a equipe o encontrou. Paralisado. Face mais feia do que ele apresentava. O espelho próximo e uma ambulância aumentou o número de pacientes do hospital psiquiátrico da nossa cidade.
O filme " O espelho" foi lançado. Fracassou e também aumentou os pacientes de alguns psicólogos, pois assistir a um conjunto de imagens tão desprezíveis é emocionalmente intolerável.
Passados 10 anos e 3 meses e 1/3 de dia, H. voltou aos seus trabalhos matinais. Agora ele dirige um caminhão que entrega espelhos para clientes que apenas gostam de apreciar seus egos. E no espelho de egos, é difícil premiar alguém. Hollywood terá um cubo mágico a resolver.