Em Tempos de Pandemia 12

A interlocutora esboçou sorriso sereno, de modo que apareceram as duas covinhas que tinha nas maças do rosto, escancarando o esbanjamento dos lindos dentes que portava.

Era ela. Elba não pôde acreditar. Era ela, Tamara, amiga de infância.

Não era possível! aquele sorriso, era somente dela, a amizade que durou do nascimento até o início da puberdade, não deixaria escapar de dentro dos paredões da memória. O semblante denso, e ao mesmo tempo, expressando amor , a alma de uma menina que foi sua melhor amiga.

Elba teve a amizade de Tamara na base do amor fraterno, desde que passaram serem vizinhas o grude começou, aquela amizade que não era condicionada à cor da pele, da condição social e da religião que cada família nutria. De modo consentido, para serem aceitas no seus melhores, uma e outra não tinham tempo para analisarem quem tinha o melhor vestido, a casa mais bonita, o carro mais caro na garagem. Lidavam irrestritamente na liberdade que a alma de cada uma pediam para serem felizes, crianças livres que tinham um único e exclusivo objetivo, brincar.

Uma, loira, olhos verdes,protestante, a outra, negra, olhos castanhos, cabelos negros e crespos, de família Espirita. Passaram a infância com outros amigos, relacionando o melhor do afeto que tinham na amizade, por entre árvores, riachos, bonecas, bolinha de gude, coleção de chaveiros, andar de bicicleta e papéis de carta, tarefas escolares que realizavam juntas, as gargalhadas que tiravam uma da outra das caretas que encenavam.

Elba, mais revessa à tristeza, arrancava Tamara das tristezas intempestivas, mesmo que custasse a ela o revelar dos segredos da amiga que confidenciava aos demais , o suficiente para Tamara sair aos berros revoltada, excomungando a amiga, deixando a melancolia.

Mas tinham a chave da amizade que nunca deixava interromper a relação amiga. Noutro dia, uma ou outra procurava a parceira para uma conversa, seja porque havia esquecido a caneta na carteira da sala de aula, ou o chinelo na casa uma da outra.

Quando a mãe de Elba saiu do Hospital com a filha que havia acabado de nascer, a mãe de Tamara entrou no saguão do Hospital para parir Tamara, sem saber que meses depois seriam vizinhas de rua na mesma cidade, condição que levaria as filhas serem amigas, até que Tamara mudou para o exterior repentinamente com a família, quando completara doze anos, sem deixar endereço, nem contato telefônico.

Nunca mais Elba teria notícias da amiga. Chorou muito nos dias posteriores à mudança.

Depois de mais velha, de ter acomodado a saudade, insistiu ainda numa pesquisa criteriosa na internet, sem sucesso, desistiu da busca.

Morando noutra cidade, um dia encontrando um dos conterrâneos da cidade da infância, tomou conhecimento que Tamara estava morando em Zurique.

Naquele sorriso, num simples sorriso, numa mulher de trinta, encontrou Tamara, a mesma menina da infância.

Chorou.

Márcia Maria Anaga
Enviado por Márcia Maria Anaga em 21/08/2020
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