Ele

Sentia que do seu âmago um grito de liberdade queria ecoar. Vibrava tão explicitamente, que lhe faltava coragem e vontade de fazer surgir sua alforria.

Ele era uma ilha que se isolara e dos poucos que o cercavam alguns estavam se desprendendo. Abandonou sua fé.

- Estou me despedindo, tão sombrio me sinto.

- Entregar os pontos, deixar-se abater, esta talvez não seja a única alternativa. Pode-se reagir.

- Não quero e n ao tenho ânimo para esta proeza. Eu busquei o que sou, o que quero.

Pareceu-me que o simples fato de existir o incomodava. Vive agora esperando pelo seu fim, esperando a barca para à sua travessia.

- Viver representa um tormento!

- Não entendo por que diz isto?!

- É que nada da vida me dá mais prazer, ao contrário me suga. Apenas me pede e nunca me recompensa.

- Eu penso contrário, apesar das grandes decepções.

- E foram estas que me levaram a não mais desejar viver.

- Tão indiferente me tornara por estar vivo ou morto, que nada, mais nada me tinha atenção.

- Ser indiferente ao que e por quê?

- Todos esperam de mim. Sou uma guia salvadora, carrego a importante obrigação de ser o elo mais forte de uma corrente que dificilmente pode ser quebrada ou arrancada de mim.

Pensara ele desta forma, pois todos a sua volta cobravam ou esperavam desta pobre alma a solução para os problemas que afligiam a sua gente.

- Você é ainda o único suporte que me sustenta, pois os demais não me valem os suspiros!

- E eu já não sei mais por que vivo. Tão apreensivo e esperançoso para que ele venha me carregar em seus braços.

Uma nuvem negra caíra sobre sua volta. Diminuindo ou até proscrevendo a sua esperança diante da vida. Todos o cobravam, faziam-no de espelho e exemplo para os demais.

Sua crise aumentara a cada ano. Hoje, com seus vintes e poucos anos sentia sua angustia extravasando. Resolvera se desprender de tudo, jogar-se a um breu de sofrimento e solidão. Trancou-se em si mesmo, já não tinha forças para romper seu silêncio.

- Desesperançar não vale, tão primoroso é este dom de respirar, que alguns tem em tão perfeita ordem.

- Não me consola saber.

- Na vastidão da nossa humanidade não és o único a teres tais sensações.

- Mas este fato também não me conforta em saber que outros passam por situação semelhante.

Seguro de si e das suas vontades não mais quis ouvir quem estava à sua volta. Isolou-se num claustro para o mundo e para si.

Alterou o seu modo de vestir, imergindo nas cores sombrias como refúgio das suas angústias. Vampirizou-se. Escondeu-se entre as sombras, desistindo de se arriscar, de experimentar, de ganhar ou perder, enfim de se dar o prazer de viver.

Rejeitou qualquer esperança. Sucumbiu a sua melancolia. Definhou-se na sua própria escolha, a cada dia mais intensa.