Homem do molotov "pt. 1"

Estamos em uma pandemia e parece que nem uma delas entendia a gravidade da coisa, pediram para que fizéssemos distanciamento social, ficar longe um dos outros, eu julguei que seria fácil, passamos os dias procurando maneiras de substituir o contato humano, mas foi exatamente o contrário, parece que justo nesse momento começou um comichão para sair e ver gente, esse pessoal gosta de fazer as coisas ao contrário do que deveria, será que é algum tipo de espírito subversivo?

Enquanto sento no sofá com meu sanduíche, ligo o jornal e está passando sobre alguma festa clandestina, muita gente dentro de um galpão, música alta, bebida, drogas provavelmente, distanciamento não, a polícia não prendeu ninguém, acho que haviam pessoas demais para serem presas e não encontraram os responsáveis pela festa, será que eles pensam tudo isso antes?

Ao terminar a matéria, olho para baixo e vejo o sanduíche ainda inteiro, perdi a fome, não foi a primeira matéria sobre isso que fizeram, não é de agora e considerando as conclusões, não será a última, enfureci-me, levanto e vou até a geladeira, guardo o meu sanduíche e vou até a janela, eu olho a minha rua e de algum lugar escuto uma música, é jazz, só uma casa perdida tocando jazz, fecho os olhos pra ver se reconheço quem está cantando, mas a informação que me chega é outra… lembrei da história de um assassino, não consigo me lembrar do nome do maldito, mas, lembro que ele matava com um machado e dizia que não mataria quem estivesse tocando jazz no momento, só essa casinha simples se salvaria aqui.

Pensei na notícia da festa e imaginei que seria mais adequado nos tempos de hoje, o sujeito dar cabo de quem estiver fazendo um encontrinho, ainda que seja de jazz; pensei no galpão, tinha muita gente, um machado seria muito pouco, talvez, uma bomba, uma granada, ou coisa mais simples, mais fácil de fazer, um coquetel molotov, isso, claro! Chegar na festa, simplesmente atirar o coquetel molotov e sair correndo, seria o mais lógico nos tempos de hoje, uma pena que ninguém faça isso.

Acordo de madrugada depois de um sonho, sonhei justamente que eu é quem jogava um coquetel molotov numa festa, exatamente da maneira que eu imaginei aquele assassino fazendo, não sei dizer como me sinto, não posso dizer que era um pesadelo, não sinto como se fosse, a sensação é de que foi uma ideia, não sei se vou conseguir dormir novamente…

O sol raiou e eu não dormi, passei o tempo olhando as frestas da janela até a luz começar a invadir, a maldita ideia não saiu da minha cabeça, levanto para fazer um café, vou jogar alguns restos no lixo e do lado do lixo estão as garrafas de vidro vazias… Olho no canto da bagunça, vejo um saco com as roupas velhas, trapos, penso que não teria problemas pra comprar gasolina e óleo automotivo… deixo pra lá e resolvo seguir com o meu dia.

Mais a noite, eu ligo no jornal, atualizações sobre a pandemia, mil e duzentas mortes e logo em seguida mais um flagrante de uma festa… Acho que é isso.

Saio cedo com três garrafas vazias de refrigerante e uma sacola de feira, vou ao posto de gasolina, peço para que enche as três, apesar do breve olhar desconfiado, o rapaz encheu as três garrafas, paguei e fui na loja comprar o óleo, volto pra casa, preciso começar o processo.

Henrique Sanvas
Enviado por Henrique Sanvas em 03/02/2021
Código do texto: T7175684
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