EU E OS MEUS QUERERES (BVIW)
 
Era uma vez eu, que fui dormir invadida por uma sensação de alegria e acordei nem tanto. Sentei-me na cama senti os pés firmes no tapete macio, enquanto a minha vontade era de voar alto e cair, de preferência sobre rochedos. Queria sentir a diferença entre tapete macio e pedras pontiagudas.
Ah! As favas todo o meu palavrório, pois nele nem eu mais acredito , eu só queria um dia  de paz, sem pandemia, sem tristeza, sem lembranças, sem saudades, sem ilusões, sem lamúrias;  queria mesmo era correr atrás de Arnaldo Antunes e Zizi Possi e fazer coro com eles quando cantam ...Que não tenho paciência para televisão; que cansei de ser audiência para a solidão, que agora sou de todo mundo e todo mundo é meu também ... Queria que baixasse em mim o espírito de Manuel Maria Du Bocage - a quem se atribui um anedotário cabeludo - e  eu  aqui chegasse  e mandasse ver uma impudicícia qualquer; queria dizer um montão de besteira inconsequente, sem nexo; queria subir numa árvore , nem que fosse na do quintal do vizinho, onde o mesmo se enforcou e é apontada como a árvore do terror;  queria pintar o meu cabelo de verde pra chamar atenção; queria falar alto, gesticular, dizer alguns palavrões, xingar a mãe de alguém, bater a porta, cuspir no chão, limpar a boca com a manga da blusa, palitar os dentes; queria beber cerveja e arrotar; queria sair pelas ruas apertando a campainha das casas. Queria dizer que cansei. Cansei de bons modos, cansei de mim. Cansei de correr atrás. Cansei de dizer olhe pra mim, me atropele; queria rezar um Pai Nosso, uma Salve Rainha, o  Credo  depois me benzer e dizer Amém.  Para  dormir e nem sei se quero acordar...
 
 
 
 
Zélia Maria Freire
Enviado por Zélia Maria Freire em 29/06/2021
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