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Quando todos se abeiram da minha cama, os murmúrios sobem de tom. Há de todos os tipos a aparecer, da verdade dos inquietos à mentira dos sorrisos sem motivo.

Já trataram do meu funeral, dividiam-se entre as cores do caixão e o dinheiro a gastar. Ouvi-os sem poder responder. Nem ódio, nem vontade de os castigar, apenas quero ŕecuperar. Os médicos já desistiram.

Num assomo de vida voltei a abrir os olhos, vezes sem conta só para sentir os que se queriam despedir de mim, e via lá sempre os mesmos, na azáfama da tertúlia do funeral apressado que urge dividir o dinheiro. Nem dor, nem vontade de os abraçar, nada podia mover, nada podia prever para o futuro deles. Haveria alguém que tratasse do seu funeral, possivelmente em vida, conscientes da sua situação de pesadelo, sem retorno.

Quando já nem os olhos consigo abrir, aperto a mão num frémito de desespero. Alguém que muito me quer, que vive comigo a dor de continuar, o que ainda tiver para viver, aperta-me a vida. Respondo com a força que me resta e uma lágrima solta-se dos meus olhos. Ainda ouço antes de partir:

- Adeus meu querido irmão!
Manuel Marques
Enviado por Manuel Marques em 03/10/2021
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