Apocalipse

Estou no ano de 3022. Provavelmente quem vai me ler são pessoas do século 21, não me pergunte como isso é possível, é fazer, é simples e é isso que estou fazendo. Se não aceitar esse fato trivial, não vai saber o que vou narrar. Nesse momento estou numa biblioteca na Zona Central da cidade, do lado da Avenida Pintor Carlos Moreno, mas precisamente na rua Encanador Joao Silva

Gosto muito de vim ao centro, tanto pela biblioteca quanto para depois andar de bicicleta na Ladeira Costureira Amelinha, que tem uma descida íngreme que me leva até a Praça Eletricista Fernando Santos. Outro dia, o passeio estava tão gostoso que consegui chegar até o Palácio Empregada Doméstica Dolores Silveira. Pois bem, ao contrário do que a maioria vai pensar os livros aqui na biblioteca não são digitais, que abrimos suas páginas apenas com o uso da mente, são de papéis, como costumava ser no século 20. Pois bem, vou contar a história antes que desistam. Isso aconteceu em meado do século 21.

Um dia, um torpor se deu em toda humanidade, como um sono, algo assim, não sei direito o que aconteceu. Quando as pessoas voltaram a consciência não existiam empregas domésticas, assim como também não existiam na consciência das pessoas. O sofrimento não foi tão grande, a maior parte do sofrimento se deu no que se chamava na época de classe média.

De repente quando acordaram, a casa estava uma bagunça. Estranharam, mas foi suportável, mas não foi fácil, na mesa não havia o café da manhã. Ficaram aturdidos, como assim? pensavam, não apareceu desjejum na mesa como de costume? Todos os dias aparece automaticamente pronto e apenas comemos. Primeiro, a casa bagunçada, agora estamos sem o café. Ainda atônitos, meio-dia, outro susto, o almoço não apareceu na mesa como de costume, ficaram preocupados, ligaram para os amigos, que responderam, aqui em casa acontece a mesma mesma coisa, que fenômeno estranho! Ligaram a televisão, sentaram encolhidos com o susto, era o único assunto que veiculavam. Todos aqueles aspirantes a ricos estavam sem norte.

À tarde, o costumeiro café com bolos, pães de queijo quentinhos, nada. Depois de alguns dias, passaram a comprar comidas prontas em alguns lugares, ou comer comida crua na geladeira para não morrerem de fome.

Quando ainda se acostumava com essa realidade, aconteceu outro transe, e os lixeiros, varredores de rua, as lixeiras, todas desapareceram assim como desapareceram também da consciência da humanidade que um dia esses profissionais havia existido. O lixo acumulado agora eram jogados nas calçadas, que com o tempo se encheram e passaram a jogar na rua, e dessa forma as ruas ficaram intransitáveis. os córregos, rios e até as praias ficaram infestadas de sacolas plásticas, todo tipo de plástico, caixas cheias de lixo.

As cidades entram num estado de caos. Houve muitas reuniões com as autoridades públicas, assembleias, mas ninguém encontrava uma saída. Pensaram que estavam passando por alguma espécie de invasão, ou estava imerso em alguma mudança fantástica na realidade. Todos os países se reuniram em Oslo para uma reunião de emergência para tentar compreender que fenômeno era aquele. No rádio, entrevistaram o maior especialista do mundo em urbanismo: "Alguma falha que ainda não descobrimos aconteceu, o lixo desaparecia automaticamente e de repente essa pane e como deve ser um sistema muito antigo e sempre funcionou, não estamos conseguindo penetrar no problema.

Muitas pessoas perderam o juízo, houve assassinatos cometidos por pessoas desesperadas. Em poucos meses, os carros e os ônibus não mais circulavam pela cidade. Muitas empresas perderam seus clientes, pois o consumo desenfreado foi substituído pelo medo que aquela situação gerava.

Grandes escritores passaram, ou melhor tentaram entender com seus romances o que se passava, nada mais faziam a não ser descrever o que estava a céu aberto e todos já sabiam.

Os historiadores mais respeitados dizem que depois de dois anos aconteceu outro transe na humanidade, os encanadores sumiram, assim como sumiram os encanadores da consciência das pessoas. Aos poucos os problemas hidráulicos foram aparecendo, não só nas casas, condomínios, mas também na rede pública de água, sem falar nos sistemas de esgoto. A comida, as roupas lavadas, a casa limpa deixou deixou de acontecer como sempre acontecia, assim, natural. O lixo tomou conta do mundo e durante muitos anos os estudiosos tentaram resolver o problemas e agora muitas casas estavam inundadas, vasos entupidos, além das casas estarem sem água. As pessoas estavam enlouquecendo, que mistério havia nesses vazamentos? Perguntava o mundo. Nunca falharam. "São tecnologias legadas, quem as criou já se foram e não deixaram a documentação". Disse um homem com cara inteligente numa entrevista. Mas era só mais uma opinião entre milhares, que não mudava a situação.

Os canos que vem da rua já não saem água, alguns morreram de desidratação porque aqueles que tinha alguma água guardava e não compartilhavam com ninguém. Sem falar que aos poucos os esgotos estouram paulatinamente pelas cidades e como nao tinha quem consertar a cidade cheirava a merda, pois aquela água fétidas se espalhava, ou criava imensos lagos insalubres que adoeceram muita gente. Os hospitais entraram em colapso, tamanha a quantidade de paciente. A maioria com infecção ou desidratados.

E mais uma vez os governos não se entediam, os maiores cientistas foram recrutados até Genebra, muitos simpósios, enquanto a coisa se alastrava pelo mundo inteiro. Em uma das entrevistas um grande nome da ciência disse: Para resolver esse problemas precisamos primeiro compreender o problema, na compreensão já se encontra a resposta. Somente depois disso saberemos o que gerou tudo isso. Porque antes em nossas casas a água chegava automaticamente e agora simplesmente parou, somente depois desse entendimento poderemos propor uma solução.

A cidade estava parada, lixo por toda rua, sem água nas casas nem para escovar os dentes ou beber, os hospitais lotados, além, claro das refeições que apareciam naturalmente prontas na mesas deixaram de aparecer. Um mulher alarmada dizia que a roupa que se auto limpava agora estavam sujas, o que fazer, como posso, dizia isso e sentíamos suas histerias, seu terror latente e o horror que percorria todos os lugares de modo que as pessoas quase não respiravam para não senti-lo.

Então aconteceu, creio que um ano depois , acho que foi um ano, depois confirmo no livro de história. Os eletricistas desapareceram, não preciso dizer que também desapareceram também da consciência da humanidade. Talvez esse tenha sido o mais duro golpe para o mundo. Durante alguns dias, as redes elétricas ainda funcionaram, mas logo começaram os apagões, não havia ninguém que consertasse uma tomada, consertasse uma fiação, e o mais grave, todos aqueles eletricistas que cuidavam da rede de distribuição não existiam mais. Sem falar nas hidroelétricas, das termoelétricas. Depois depois de algum tempo o apagão foi quase geral.

Os provedores de internet foram se fechando, primeiro os mais pequenos, depois, os grandes. Não tinha como as pessoas carregarem o celular, ligarem seus tablets e notebooks. As pessoas que eram distantes uma das outras, se tornaram mais distante ainda. O preço do celular caiu para menos de 10 reais, ninguém comprava, salvo como brinquedos para as crianças, que sei poder usar, nem elas se interessavam mais. Também a mesma coisa com os PCs, notebooks, televisores.

Sem energia praticamente toda a internet caiu. As big teck's que valiam bilhões viram seus papéis despencarem e despencaram mais rápido quando todos que tinham ação daquelas empresas tentaram vender ao mesmo tempo para não perder tanto dinheiro. Os grandes fabricantes de de tecnologia aconteceram a mesma coisas.

Fecharam todas as redes de televisão. As celebridades, atores famosos, atrizes, as boas e as ruins perderam a utilidade, muitas se mataram, outra enlouqueçam, de uma hora para outra não eram divas, nem sonho a ser imitado, não tinhas emprego, nem admiradores, porque a preocupação das pessoas passaram a ser apenas a sobrevivência.

As empresas ligadas ao petróleo, durante algum tempo sobreviveram porque usavam grandes acumuladores de energia, mas logo tiveram que fechar. Além desses profissionais que sumiram, também sumiram os caminhoneiros que transportavam as riquezas. Quebraram os grandes produtores de soja, quebraram as grande petrolíferas e toda a indústria lateral que sobrevivia em função delas. O preço dessas empresas se reduziram a quase nada. Outra leva de suicídio. Sem nada pra comprar o dinheiro foi perdendo o significado, os bancos quebraram, mas antes disso milhares de agências foram incendiadas numa vingança há muito guardada. Seus grandes executivos se tornaram quase mendigo, E a rede de prostituição foi profundamente abalada, ainda mais a de luxo, que agora se entregavam ardorosamente por copo d'água ou um pedaço de pão.

Um grande especialista que agora fazia suas análise em praça pública , lembrando os velhos profetas, disse: estamos vivendo uma crise de valor sempre precedente, mas todos esse caos cedo ou tarde vai ser resolvido, pois as maiores mentes do planeta estavam buscando entender porque o mundo parou. Sendo que tudo está como antes.

Quando o google, a microsof e a apple fecharam as portas ninguém ficou sabendo. Ao longo dos anos aconteceram outros desaparecimentos, tanto de alguns profissionais como também da consciência que a humanidade tinham deles: as costureiras, ficou raro encontrar uma roupa, os limpadores de jardim, as frentes das casas pareciam uma minifloresta. Os pedreiros, os ajudantes de pedreiros, os cozinheiros de restaurantes.

Aos poucos todas as luzes da civilização moderna foram se apagando e uma época profundamente desoladora foi tomando seu lugar. Os cientistas aos poucos foi perdendo o fôlego para achar uma solução, a única coisa que sabiam era: todas as coisas que se resolviam sozinhas, deixaram de funcionar. A humanidade se viu sem rumo e sem esperança. A depressão, o desespero, a insegurança, há, quase esqueci, os seguranças também desapareceram, e todos passaram a andar armados, seja com faca, revolver ou apenas um pedaço de pau. E milhões de pessoas mataram um ao outro, pois todos estavam desequilibrados. O mundo foi se apagando, não havia emprego, comida, água em casa, arrumadeira, eletricistas, mas eles não sabiam disso, só sabiam que as coisas deixaram de funcionar automaticamente.

O café se fazia sozinho, o cano quebrado se arrumava, a energia chegava em casa sem nunca falhar. Ninguém sequer chegava perto do problema porque nunca ninguém viu algo assim. Apenas uma pane em alguma coisa que fez com que tudo que funcionava automaticamente deixou de funcionar. Diziam os mais otimistas.

Bom, como as coisas se resolveram não cheguei ainda nessa parte da história, mas já sei que demorou uns 900 anos para o mundo voltar a girar como antes.

Bom, agora preciso ir, tenho um encontro...quase esqueci de falar, sou um estudante secundarista de uma escola pública e tenho uma vida política bastante movimentada. Daqui a pouco tenho um encontro com um Deputado da Comissão de Educação. Não fica longe, basta cruzar a rua Limpador de Esgoto Deusdete oliveira, logo ali no 416 e já avistamos o Prédio Limpador de Fossa Abdias Coelho, que é onde funciona o Congresso nacional.