A VERDADE SOBRE JANUÁRIO

Pouco se sabia sobre Januário. Ele que veio não se sabe de onde, uns diziam da Paraíba, outros cismavam que era do Maranhão, mas Januário, homem de pouca conversa, não dava informações sobre sua pessoa. Vivia naquelas cercanias, sozinho, numa casinha simples de um cômodo e cozinha, lugar simples, quintal de chão batido onde umas galinhas ciscavam; um pé de café bem na entrada da propriedade, onde um cerca de arame farpado, fazia a divisa do seu mundo solitário dos demais terrenos da redondeza.

Ele saí vez por outra para comprar algo na cidade, ia a pé mesmo, era visto andando pelas estradas do lugarejo, e nestas vezes, não tentava ser simpático. Havia quem tentasse entabular conversas com ele no armazém, quando ele chegava, mas Januário era muito reservado. Falava somente o necessário, e nunca souberam mais sobre. Era um sujeito avesso a conversas, e calado seguia, seus passos firmes e resolutos, como se de forma mecânica, houvesse em sua mente algo que sugasse sua atenção e mantinha-o longe de distrações.

Foi pelos dias chuvosos de novembro que o pessoal da região deu por falta de Januário naquelas estradinhas, o sujeito esquisito, e começaram os boatos e aquele disse me disse.

O que tinha havido com Januário? Haveria ele ido embora dali? Não, falavam outros, que curiosamente viram fumaça saindo do pequeno casebre onde ele vivia, então ele estava lá. E começaram a especular, por que ele havia sumido, não era mais visto.

Uns moradores mais corajosos (curiosos, também), foram até o lugar, para saber de sua existência, de repente quem sabe, pode precisar de algo ou eles podem saber de alguma coisa que renda naquele povoado mais fofocas. Lá chegaram, e se depararam com a porteira fechada, chamaram, e nada. Depois de insistirem, abriram e foram até a casa, bateram na porta repetidas vezes, nenhum ruído ouviu-se fora as batidas na madeira desgastada pela ação do tempo. Olharam-se estranhando o fato, deram um bisbilhotada nos fundos da casa, e como nada havia, resolveram entrar e, facilmente o fizeram porque a porta não tinha ferrolhos ou trancas, depois de abrirem viram que a casa estava desarrumada e vazia. Um cheiro de umidade exalava na pequena casa. Uma cama de solteiro bem simples e desarrumada compunha o ar solitário e acre do cômodo; uma cadeira da palha e alguns pertences que foram deixados para trás, como jornais e papéis velhos, amarelados pelo tempo. Sobre a pia uma xicara de café suja e, no fogão a lenha, um amontoado de cinzas indicando algo que se perdeu no fogo. Estranhando tudo, um deles pegou um jornal em cima da cadeira e leu a notícia de capa, que datava de dez anos atrás.

"Ainda encontra-se desaparecido, Januário Aragão, comerciante do vilarejo de Padre Onofre"

Logo abaixo a descrição do caso.

O comerciante da região fora visto pela ultima vez, no caminho de sua casa, próximo ao vale da Pedra surrada, sendo que suspeita-se que seu desaparecimento tenha a ver com a tragédia ocorrida envolvendo Januário e o Coronel Feitosa Lopes. O coronel homem austero e de extremo rigor cristão, havia proibido o namoro de sua filha, Idalice de apenas 15 anos, que estava prometida ao convento das freiras, a fim de ter uma vida cristã baseada na pureza e na fé fervorosa, sendo o desejo de seu pai. Quando soube que Januário estava enviando mensagens para Idalice e esta, enamorada do mesmo, houve discussões e desavenças, pois o coronel não simpatizava com Januário, fora a condição que ele impunha a filha, de ser freira, tinha um agravante para Feitosa Lopes, o dito pretendente vinha de um outro casamento fracassado, coisa que coronel achava inconcebível.

Diante da proibição, Idalice se jogara de um barranco no grande lago da propriedade; e com seu falecimento, o coronel adoeceu, vindo a falecer no mesmo ano, de desgosto, diziam os habitantes do local.

Surpresos, os intrusos curiosos, se entreolharam. Uma notícia de jornal tudo explicara.

https://palavrasnotasevivencias.blogspot.com/