Miniconto - Parede
Uma e meia da tarde e Janete está com a cabeça grudada na parede. A sensação gelada do tijolo contra a testa pressionada é refrescante e por um momento congela seus pensamentos. Conta até três baixinho e bate mais uma vez. Dessa vez, com tanta força que a cabeça quase entra na parede. Cola seus seios na parede gelada, o cérebro fica mudo por uma fração de segundos. Silêncio escuro dentro da cabeça de Janete. O ar que sai de suas narinas condensa na parede. A parede faz frio enquanto Janete queima. A mancha molhada feita de seus suor e sua respiração forma o negativo de sua cara, uma segunda Janete concreta e cinza. Seus olhos negros arregalados fitam a parede de tão perto que a imagem se cruza lisérgicamente. Passa a lingua devagar e o rastro de sua saliva constrói um caminho. A segunda Janete é cortada em pedaços pelo rastro de saliva. As mãos espalmadas acariciam esse caminho enquanto ele some entre seus dedos tensos. As marcas de saliva na parede não são eternas, melhor continuar desenhando com o sangue que escorre da testa. Conta até três baixinho e bate mais uma vez.
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