Quem diria que depois de 58 anos o amor viria? Tadeu foi premiado. Da sacada do apartamento, via-se o “Dom Juan”: acendia uma vela, colocava uma canção de Roberto Carlos e com a taça de vinho na mão, rodopiava a varanda, aguardando o momento de encontrá-la. De frente ao prédio estava um famoso colégio de padres que foi um cenário para milhões de romances proibidos. Tadeu fora o aluno mais inteligente de todos os tempos. Recebia medalhas de honra e esnobava a sua capacidade extraordinária de pensar.

Formou-se engenheiro e mantinha um escritório, que era coadjuvante na construção do seu patrimônio. Calculista por natureza, jamais quis se envolver com alguém que tivesse que dividir seus bens: “melhor sozinho endinheirado que junto endividado”. Recebeu a comenda de maior destaque pelo brilhantismo profissional. Não lhe faltava mais nada. A vida ia muito bem, não fosse a rasteira da memória.

Leitor compulsivo de jornais, viu-se de calças caídas, por uma mulher que, vira e mexe, aparecia na coluna da cidade. Cabelos encaracolados, vestes brancas, arco de rosas: uma noiva. E ele passou a perseguí-la em seus mais devotos sonhos. Ela estudou no colégio, local do encontro.

Depois da vista, descia apressadamente com seu chapéu e fraque. Eram vinte pras nove. O portão se abria e ele corria até o banheiro feminino, onde a resgatava e corria de braços dados pelos corredores do monumento. Todos já sabiam da paixão e sequer se aventuravam a contê-lo. Não fosse a irmã que, delicadamente o abraçava e o levava pra casa. A esquizofrenia o tornara um amante da noiva do banheiro. Talvez fosse uma lenda, mas Tadeu jamais deixou de levar flores e a aliança para pedir a mulher em casamento. Morreu meses depois, quando rasgaram o jornal...

Mônica Cordeiro
Enviado por Mônica Cordeiro em 08/11/2022
Reeditado em 09/11/2022
Código do texto: T7645427
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