Mini conto/ Quando viver, torna-se um absurdo

Seu nome era Diferente. Alguns o chamavam de Minoria, outros de Aberração e os mais próximos de Amigo. Diferente vivia com a mãe, nenhum irmão. O pai saiu pelo mundo e nunca mais voltou. Diferente cresceu junto a primas e primos, sempre preferiu brincar com as primas, pois se sentia melhor acolhido.

A sua mãe, uma mulher guerreira, religiosa e de princípios conservadores. Projetava no filho um grande doutor, pai de seus netos e a peça necessária para o preenchimento do vazio que o marido deixara.

Diferente dedicava todo seu tempo aos estudos. Preferia as artes, às exatas. Inteligente, dedicado, sonhador e dono de uma personalidade ímpar! Educado, amoroso, companheiro, resiliente e muito responsável. Estava sempre querendo ajudar a mãe nos afazeres da casa, esta, nunca permitia. Diferente tinha que somente estudar, era o que dizia.

O tempo foi passando e Diferente foi cada vez mais se isolando das pessoas, inclusive da mãe.

A mãe de Diferente notava que o filho estava mudando muito com a idade. Falava pouco, comia muito e dormia de menos. O enchia de vitaminas, atividades extras da escola, compromissos contra a sua vontade na igreja e nenhuma conversa. Diferente queria roupas despojadas, não pode; cabelo personalizado, não pode; passear no shopping com as amigas, não pode; colocar um avental e fazer um bolo de cenoura, não pode; enfim, não podia nada que não tivesse dentro das regras determinadas para um adolescente homem alfa, prometido a um casamento fértil e um doutor renomado.

Diferente não se encaixava em lugar algum. Seu mundo se resumiu num espaço de dois metros quadrados cercado de monstros.

Um dia, Diferente tomou uma decisão: “vou encontrar o meu eu”. Escreveu um bilhete para a mãe e deixou exposto na escrivaninha. Vinte e quatro horas depois o corpo de um adolescente foi encontrado estendido numa rodovia, abaixo de um viaduto.

A mãe encontrou o bilhete do seu único filho que dizia:

“Me perdoe por não ser o seu doutor. Viver, tornou-se um absurdo”.