Mini conto: O açúcar dos beija flores

Ao observar a quantidade de beija flores nos arredores de nossa casa, meu marido resolveu alimenta-los. Adquiriu um bebedouro com flores artificiais em volta e deu início a sua boa ação em prol das pequenas aves. Começou oferecendo um produto adquirido na casa dos pets. Um açúcar colorido de aroma marcante. No início recebíamos a visita diária de dois ou três beija flores.

Na tela da janela sempre apareciam outras espécies disputando a iguaria. Por vezes, estes adentravam casa a dentro para escapar das bordoadas dos donos do pedaço. Com o tempo, a população cresceu. Meu companheiro recarregava o bebedouro três vezes ao dia. Até as dezoito horas, eles ficavam por ali. A despesa com o tal açúcar foi crescendo. Já parecia que tínhamos em casa um viveiro de pássaros, pois já não era mais somente os beija flores que eram atraídos pelo aroma daquela substância viciante. “Será se essas coisinhas bonitinhas não entendem que essas coisas custam caro e não dá pra abusar? As flores estão aí bem na sua frente, são de graça”! Não, eles não sabem disso. O jeito foi procurar baratear os custos com a guloseima. Agora já não dá pra voltar atrás e deixar de servir o banquete. Ele fugiu das lojas dos pets e correu para o supermercado dos homens. Começou oferecer açúcar comum. Tudo bem, não tinha a mesma coloração, mas o sabor e aroma devem ter superado todas as expectativas, pois como um telefone sem fio, começou aparecer mais e mais aves. Não era nada tranquilo para os beija flores, que passava o dia expulsando invasores da sua fonte. Meu gatinho, que de início estranhava as visitas, afugentando-as com investidas na tela, passou a deixá-las à vontade.

Foi então que meu companheiro, alimentador dos beija flores e agregados, precisou fazer uma viagem, deixando-me responsável pela tarefa. Depois de passar dois dias, de três a quatro vezes, recarregando o tal bebedouro com água açucarada, pensei: “ é muito açúcar! Isso pode fazer mal aos bichinhos!”

Na verdade, não tinha observado esse movimento, essa dinâmica e essa cumplicidade entre ambos. Decidi parar com o açúcar. “Tudo bem, eles devem vir aqui , também para tomar água, se quiser açúcar que vão até as flores, vou colocar somente água pura”.

Foi o que fiz.

No dia seguinte, acordei pela manhã com a algazarra de pássaros na árvore em frente à janela. De primeiro momento imaginei que agradeciam pela água pura. Para meu desespero, quando voltei os olhos para o bebedouro, estava exatamente como coloquei no final da tarde do dia anterior. Passei a observá-los. Alguns davam voltas próximo a tela da janela, outros cantavam e outros levantavam voos e desapareciam e reapareciam. Mas, nenhum colocava o bico na tal florzinha que dava acesso a água. Tornou-se uma disputa entre nós. “ é o que tem pra hoje, se não querem, ficarão com sede!”.

Bom, o bebedouro ficou cheio, intacto, por uma semana, o silêncio voltou a reinar na minha janela. Os pássaros foram desaparecendo um por um e não voltaram mais. Meu companheiro, ao retornar, observou o bebedouro cheio, estranhou. “ O que aconteceu? Diminuiu a população”? Eu respondi: “eles foram embora, acredito que vinham não só pelo açúcar, vinham por você também.”

(rsrsrsrsrs) Logo ele correu até o bebedouro, lavou bem lavado, e o encheu daquela garapa viciante. Ficou a aguardar o retorno de seus exóticos pets. Não precisou esperar muito. Primeiro chegou o casal de beija flores, duas horas depois, lá estava toda a passarada disputando a iguaria. Eu? Eu fiquei aqui a pensar: “ e agora, quem vai fazer a polinização ?