Um amor de verdade

Como se fosse hoje eu chegava, quase sempre atrasada na escola e ele estava lá no portão esperando pra entrar comigo e colocar a minha carteira ao lado da dele. Assim nossa amizade caminhava. Ele falando das suas namoradinhas e me incitando a namorar o seu amigo e eu, pueril apenas o olhava.

Assentados sob a pilastra da escola, inúmeras vezes conversávamos e ele as vezes tocava em seu violão canções, que eu me deliciava. Riamos sem razões e conversávamos nos padrões, sem saber, que o tempo e o vento em seus momentos germinava a alimentar, qualquer coisa que a cada dia nos envolvia a aproximar. Embora fossemos muito amigos, não era como a irmanar, havia algo, que na diferença pulsava a nos cegar.

Entre tantos pores de sol, o rio Amazônas, que cortava Macapá suscitava aquela brisa quente úmida, que como os troncos a beira daquele rio mar, levava e parecia trazer de volta a nos dizer, sem nos explicar, que um dia nossas vidas iriam se encontrar, pra vivermos, o que realmente em nosso âmago vivia sendo relegado por nossas imaturidades.

Como adolescentes, que éramos a vida era um brilho, clichê de tudo a vagar. E após as aulas, voltando pra casa, as vezes ficávamos a enveredar, a passear meio que sem rumo pela praça do coco na saudosa Zagury , quando não tirávamos pra conversar nas vielas do museu Sacaca, que ficava bem próximo de casa.

Outro dia e ele estava religiosamente lá, lá no portão a me esperar. Na minha chegada, como sempre atrasada, sem dizer nada riamos como a conversar e nas aulas mais monótonas, as mais interessantes ele estava lá.

Nesses entre e sai de dias e dias eu já o olhava de outra forma, sem perceber que ele me olhava. Talvez pela insistência camuflada dele em me apresentar o seu melhor amigo, que queria a mim namorar.

Como água mole em pedra dura, tanto bate até que fura, acabei me deixando convencer em namorar o seu melhor amigo. Enquanto ele me iludia, em nada demostrar por mim, além da nossa forte amizade. a contar suas histórias de namoradas falsificadas, sob o efeito de suas baladas cover refratadas. Os dias se iam como deveriam, eu com o seu melhor amigo, conquistando paulatinamente o âmbito familiar com a minha inata essência de um lírio, e ele fingindo e se escondendo da dor, como o nosso mentor. Frequentando normalmente a minha casa, como a me ensinar as matérias de minha dificuldades, mesmo contra a vontade de minha mãe, que o olhava dos pés a cabeça e o rotulava negativamente, principalmente por ele andar, com a camisa meio desconsertada com aquele seu cordão da moda, como se não ligasse pra nada. Dizia ela pra mim:

- Esse ai, não vai dar longe.

Eu ria desconsertada contra dizendo, que o jeito dele não queria dizer nada, ele era um rapaz que seria mais do que aparentava, mas a implicância dela se formalizava.

Em contra partida, o meu não assumido namorado, ela endeusava. Falava bem do rapaz, o gabava e o capacitava, querendo me impor as luzes da ribalta, que quase sempre eu renunciava.

Nos meus momentos a sós com o amigo do meu amigo, que eu ficava, ele me pressionava a sedimentar o nosso relacionamento, principalmente, quando alguém em sua casa no assunto tocava. Eu já amiga da mãe e de todos os familiares, que me chamavam de nora e de cunhada, mesmo que não dissesse nada, estava completamente cercada.

Na omissão, como diz o direito vale a ação, que já esta sendo praticada. E seguíamos, seguíamos até que o nosso amigo em comum nos presenteou com a informação de que iria embora, pra outra paragem fazer faculdade e decidiu fazer uma festa de despedida para os amigos, que não incluiu o nosso amigo em comum, meu namorado não oficializado.

Lá, naquele fim de ano, brincamos e dançamos, bebemos e comemos sob o som ensurdecedor da moda. Tudo preparado por ele, como a nos negar, um subterfugio perfeito pra quem tem um plano de fuga. Aquela noite foi tudo menos o que o meu coração cogitava em suas mais profundas ansiedades.

Quando tudo parecia silencioso, ele, o meu melhor amigo me surpreendeu com uma nova e última festa de despedida só pros amigos íntimos, que aceitei sem titubear. E lá chegando, observando a calmaria do lugar, pela primeira vez, mais do que a sua noticia de partida estava realmente surpresa a me perguntar, onde estavam os outros convidados, que sem suspense e nem drama foi respondido pelo brilho no seu olhar. Como a valsar sem musica, só com as suas palavras, ele começou a verbar. Chegou sem pressa e começou dizendo que aquela festa de despedida, era só pra nos alinhar. Sem saber o que falar, apenas ouvia o que o meu coração sentia pulsar.

A me olhar nos olhos, a segurar minhas mãos e tocar os meu cabelos no rosto, como a brisa do rio mar, sob o efeito retrô , o beijo veio sem que pudéssemos evitar. Aquele momento, nos entorpeceu de uma necessidade há anos represada, nos envolvendo num vício indubitável. A sua boca queimava na minha como a tatuar as suas mais sinceras verdades e o meu corpo fiel a tudo que sentia se entregava sem reservas de domínio, porque o amava, verdadeiramente o amava.

Na pausa da sanidade, ele com o seu jeito meio que sem dizer nada, pegou o seu violão e entoava aquela canção, que ele fez pra mim e que me fantasiava, a lisonjear-me, como a musa de sua estrada. Se as lágrimas oportunizadas não escreveram, o que deveriam , em sua morada, os meus lábios, tantas vezes chamados por sua hábil sensualidade o faziam sentir, naquele instante, toda a minha vontade.

Como era sabido, ele em três dias iria embora, por isso resolveu me contar o que eu também queria dizer, porque tudo que importava era estar ali vivendo aquele tempo. Mas ele se foi e eu continuei a namorar o seu melhor amigo.

Após três anos ele retorna à Macapá por causa de uma fatalidade , seu avô que morava com ele noutra cidade adoeceu e eles tiveram que retornar pra perto da família, onde teriam o suporte de melhor qualidade.

Como o vento nas flores após a chuva da cidade ele apareceu diante de mim e ai, não tinha como resistir. Era uma paixão, que certamente , se devidamente regada consumaria num amor de verdade. E diante um do outro resolvemos assumir, o que nunca assumi com o seu amigo.

Ele mesmo falou com o seu amigo, dizendo do amor que tinha a mim e eu, posteriormente confirmei e todo aquele imbróglio , que parecia um pesadelo, se desenlaçou sem tantas perdas. Em seguida ele foi a minha mãe e contra a sua antipatia, sua regras impostas conseguiu argumentos pra namorar comigo. Ai foi aquela alegria, sua mãe, suas irmãs e suas tias todos gostavam de mim tanto, que em dado momento sua mãe falou, que gostaria de ver um monte de japonesinho andando pelo meio da casa e eu a cada dia, sonhando acordada me perdia num sentimento, que em meu peito desmedidamente só crescia e avançava.

Ele era tudo o que eu queria. Por tanta vezes fazíamos planos de uma grande família. Vivíamos um amor a fantasia. Ele era como a luz do dia, e eu como a noite a segredar em suas horas de silencio. Nunca esqueço, que a gente passeava lá pela frente da cidade, sentindo aquela brisa intensa, só pra ver a lua pousar no rio de água barrenta. Depois da caminhada chegávamos na sorveteria Santa Helena tomávamos um sorvete e rindo como dois adolescentes ele me deixava em casa.

Até, que um dia, minha mãe envenenada por uma vizinha fez um escândalo comigo, como se eu tivesse cometido um crime. E o que aconteceu não foi nada, apenas ele saiu de casa um pouco tarde porque perdeu a hora da condução, enquanto a minha mãe viajava.

Por isso, acho que mais ainda pela antipatia sustentada por ela, sem direito a defesa tive o meu celular lançado na parede, como se o pobre coitado fosse o alcoviteiro daquele amor e em seguida, como deportada fui mandada embora pra Belém, a cidade das mangueiras.

O tempo, as vezes são interperies na relação e a cada encontro das angustias e frustrações a distância, a gente foi obrigado a dizer a nossa paixão, apenas um seco não, em comodidade.

Vidas separadas, eu segui sofrendo muito e muito na minha estrada, noites em claro eu curtir, mas como não mandava na minha vida, pois como dizia minha mãe num provérbio comum no norte:

- Se come do meu pirão prova do meu cinturão. E enquanto eu te sustentar vais seguir o que eu quero.

Impositivamente, obedeci o que era a mim disposto. Ele casou-se com outra pessoa e eu me formei a andar pelas ruas como se o meu coração ainda tivesse um outro dono.

Numa dessas voltas, que o mundo dá, o adolescente, que parecia um nada se tornou arquiteto de nome conhecido em Macapá. Onde quis o destino fazer valer a sua identidade, a certo dia da necessidade de minha mãe, em construir a sua casa, caminhava com minha irmã, foram procurar alguém gabaritado pra fazer o desenho e acompanhar a construção, quando elas sem qualquer indicação, a não ser do próprio tino foram a única empresa, que tratava do ramo e lá encontraram não só o que queriam, mas aquele rapaz, nos mesmo moldes da adolescência, que era o meu amor. E diante de minha mãe, segundo minha irmã, ele tremulejava, talvez pelo trauma com ela passado.

Sem perder a hora, minha irmã a dizer o que eu queria falou:

- Veja ai o rapaz, que a senhora hostilizava. Poderia ter casado com a sua filha e estar muito bem obrigado. Construindo de graça a sua casa.

Sem perder a pose e nem a autoridade, a mãe repeliu dizendo:

- Azar o dele, naquela época ele era estranho mesmo, usava uma correntinha no pescoço, com estilo meio ripe.

Mais cedo ou tarde, eu já comprometida e ele casado nos encontramos por acaso, apesar do tempo ainda me sentia com ele bem a vontade. Agora com a maior idade, cabelos brancos e muita responsabilidade, mesmo com o se abraço de segundos de saudades, fomos apenas amigos, nos comportamos sob a égide da integralidade, falamos de coisas e coisas e ele só me tocou, quando disse da falta de um filho em sua relação, mas ficou no oculto, qualquer ideia de vivê-lo na insanidade.

Lá pelo calor do meio do mundo, entre o hemisfério sul e norte passeando o encontrei de novo, agora com um filho, como razão de sua vontade. Conversamos pouco mas o seu olhar, seu hálito de necessidade, sua paciente calma a me visitar como a água da chuva no verão, despertou a essência dos segredos ocultos do meu coração, que ainda hoje guardo como camafeu, amuleto de uma história, na esperança de um dia, como as noivas com seu buquê, se não for ele, que seja alguém tão especial, a ponto de me surpreender o coração e eu possa viver um amor tão lindo como aquele de verdade.