Um Homem nada Célebre

Se a ironia não comanda o mundo, é certo que ela gosta de dar palpites. E percebi isso quando conheci um certo escritor que ao mundo foi sepultado antes de nascer.

Foi há dois anos e não o conheci em pessoa, mas em obra. Li, assim como várias pessoas do meio, o conto que ele enviara à redação de uma famosa editora, por e-mail.

E antes que prossiga com os fatos, faço uma pausa para falar das emoções. O texto desse homem, conseguiu algo raro nos dias de hoje (e talvez em todas as épocas), agradou aos editores (e ao público, por extensão) e à crítica.

Os primeiros viram naquele texto exatamente aquilo que faz um livro vender, e não é segredo que essa é a maior preocupação dos editores. Já para os homens das letras, aquela fórmula pronta era uma metáfora, uma crítica, em suma: "uma obra de gênio, que consegue ocultar um lobo em pele de ovelha", declarou um importante crítico ao ler o conto.

Em apenas um final de semana o texto circulou por toda a cidade, intrigando todo o meio: como poderia alguém escrever um texto daqueles? Digno de um Machado de Assis, diziam os mais entusiastas, ainda que o conto tivesse propriedades bem diversas daquelas que consagraram o velho bruxo.

A notícia veio na segunda-feira, mas não pela imprensa. Veio pelo mecanismo de comunicação mais eficiente já criado pelo homem. Assim, ao meio-dia já se sabia do fato em todo o meio. O escritor daquele texto havia morrido no dia anterior.

Os editores, sabendo disso, decidiram que seu texto não seria publicado. Como lançar um escritor já morto e que possuía apenas um texto escrito? Impossível. Ninguém pagaria por um escritor de apenas um conto apenas.

Assim ficou decidido. Não se publicou um linha a seu respeito, nem mesmo no obituário. Já que o homem estava morto, porque fazer nascer o escritor?