BAdaLAdaS ou balas dadas

Evaporam os poucos segundos da tua vida nesse branco em tua boca. Minutos esfumam-se frente a esses olhos de tédio profundo. Alguma novidade? – perguntas ao assassino teu vizinho. Um corpo vai ser encontrado boiando naquela lagoa nas ave-marias. Beleza! – desejas sorte a teu colega e retornas à fumaça. No quarto, na mesa onde teus planos sórdidos são arquitetados, o modesto 38 repousa ao lado de Rimbaud. Ambos entendem-se: Rimbaud e ele. Tu e Rimbaud. A tua relação com o cigarro, ele entre teus dedos... sempre gostei de ver teu olhar em meio a toda aquela fumaça, o filtro nos teus lábios, teus dentes nos teus dedos, e essa testa franzida de quem esconde os mais excitantes segredos.

A tarde inteira assim e o quarto cheio de tocos pelos cantos. Confere as balas. Esse lance de roleta russa nunca foi uma boa. Olhava bem o cano, acariciava o gatilho, contava e recontava as balas. Apontou para a parede, gritou o vizinho. O presunto tem nome? Teófilo. Nome feio pra caralho, ein? Então teu sorriso escapa pelo canto da boca ao pensar na ilusão do nome. Segue rumo à lagoa. As águas ainda desertas refletem um céu vermelho de fim de tarde de outubro. Na espera, um cigarro te acompanha e ao longe avistas a encomenda.

Sorve teu cigarro lenta e calmamente à beira da lagoa, mirando com o olho esquerdo o tal amigo na outra margem. Cospe na água e vai ao encontro dele. Tudo bem, Teófilo? – perguntas sem querer ouvir respostas. Rápida ou lenta? É você quem escolhe. Só quero que seja agora. Então tu descarregas todas as balas no corpo franzino do Teófilo, que mais parece um louva-a-deus. Dá as costas ao corpo que submerge em sangue, exatamente nas ave-marias. Voltas à tua casa com essa calma de quem acaba de ver sangue nas mãos e reacende a carteira de cigarros. Covardes!