CONSULTA MÉDICA

Em uma tarde qualquer a jovem doutora Maria da Graça, gaúcha, médica generalista, 30 anos, estava atendendo numa unidade de saúde da cidade do Rio de Janeiro. Com andar de veterano de gafieira, adentrou no consultório, um usuário do SUS. Este, um jovem portuário de 35 anos, era Genésius da Silva Fortes. Exame de rotina.

Genésius era um afro-brasileiro. Um metro e oitenta e cinco, tipo saradão. Carioca da gema. Pinta de surfista. Vozeirão tipo puxador de samba. Sedutor e manipulador. Ao ver a jovem médica gorduchinha, com pinta de estudante de colégio de freiras, jogou seu encanto para cima da profissional. Doutora Maria, apesar de seus gestos abrutalhados, não aparentava ser muito gorda devido ao fato de ser uma mulher alta. Possuía um belo e simpático rosto e tinha uns traços fisionômicos que passavam a imagem de uma garota indefesa e embaraçada.

A médica, que de boba não tinha nada, imediatamente sacou as intenções de Genésius e tolamente resolveu dar corda ao crioulo. Jamais ele poderia imaginar que aquela profissional tinha outra opção sexual e com toda certeza não era por homem.

Ela fora criada no meio de peões; seu pai, dono de um pequeno boliche, nas cercanias de Pelotas, queria um filho homem, e por isso Maria fora criada nas lidas gauchescas como um guri, sem regalias.

Mesmo tendo uma infância difícil para qualquer menina, ela conseguia passar às pessoas, a imagem de uma jovem totalmente fragilizada. Não foi diferente com Genésius. Aquele ar de uma pessoa desprotegida que a médica possuía foi como um eficaz combustível excitador para o rapaz. O folgado crioulo desfiou todo o seu rosário de sedução para cima da doutora. Ela, boquiaberta, só escutava a conversa fiada do malandro quando, de repente, sentiu que se desse mais corda, seria difícil colocar o rapaz na linha. Resolveu, então, iniciar os procedimentos clínicos.

— Muito bem, seu Genésius, o que acontece com o senhor?

Com um forte sotaque carioca, ele satiriza:

— Corrrta essa de senhorrr, madame. Pra linda dotora, sou você. Aliás, a criança pode me chamarrr de Gené. Ta ligada?

Nesse momento ela sentiu que o abusado crioulo tinha se excedido. Enrubesceu de raiva. Ao vê-la corada, o rapaz ficou ainda mais excitado; sentiu-se completamente no comando. Com essa, ele pensou: “Essa lebre está no papo. É só comer.” Assim, convidou-a para jantar naquela noite.

— Você fica bonita com o rosto vermelho, parece uma torcedora do Inter.

“É, pensou consigo mesma, o moço ultrapassou os limites toleráveis. Se o desgraçado soubesse que detesto homens e que sou gremista até no inferno, com toda a certeza ele agora teria um enfarte.”

Sem se conter resolveu dar cabo daquela situação.

— Agradeço seu convite para jantar, mas, primeiramente vamos ver sua saúde. Não é para isso que o senhor está aqui?

Sentindo a barra pesar, Genésio descruza as pernas e levanta o traseiro que já estava confortável e ousadamente instalado sob a mesa da doutora.

Ela passa um lenço de papel para ele e pede que jogue fora a goma de mascar, para ver sua garganta. Surpreso e já um pouco desconcertado, obedece.

— Abra a boca...Tussa!... Você fuma?

— Tudo!

— Como, tudo?

— Desculpa. De tudo!

— O senhor bebe?

— Todas!

—O senhor é tão novo, um moço tão simpático. Não tem medo da impotência?

— Êpa, dotora! Pega leve. Não sou gaúcho. Sou daqui do morro.

O rapaz perdeu, naquele momento, a oportunidade de ficar calado. Sem demonstrar contrariedade, mas, na realidade possessa da vida, questiona:

— Você acha que ser parido no Rio de Janeiro garante ao cidadão uma virilidade eterna?

— Carioca é porreta!

— Abaixe as calças.

— O quê? perguntou totalmente desconcertado.

— Tire as calças e a cueca, e deite-se naquela cama.

Apavorado, Genésius obedece. A médica pergunta:

— Você é flamenguista?

— Êpa, dotora, sou botafoguense, com muito orgulho!

— É, mas está com as cores do Flamengo, no rosto. Enquanto calçava a luva na mão direita, a moça pede para Genésius virar de bruços e só levantar as nádegas.

—Vamos ver como está sua próstata. Mas, peço que nos perdoe pois estamos com falta de vaselina aqui nesta unidade de saúde.

O crioulo, que já previa que sua zona de segurança estava na iminência de ser inexoravelmente atacada, ficou ainda mais apavorado, arregalando os olhos ao ver o tamanho do dedo da médica.

Com a voz um pouco trêmula, faz um desajeitado e tímido comentário sobre os dedos grossos e compridos da “dotora”. Ela responde:

— É que lá no Rio Grande fui domadora de cavalos xucros desde a adolescência.

Talvez seja por isso que tenha ficado com mãos tão grandes. Mas, o senhor está com frio?... Quer que eu lhe cubra? Pobrezinho, está tremendo...Não se constranja, fique calmo, é simplesmente um exame de rotina, vamos lá ... Olhe para a sua direita, para aquele belo quadro na parede.

— Quadro? ...Que quaAAAAAAAAAAdro?... AAAAAAAaaaiiiiiiiiiii!!!

Ao sair do consultório, meio mancando, Genésius, com a fisionomia cabisbaixa parecendo um frei capuchinho recém-ordenado, de repente teve uma profunda empatia com o tatu que está na toca, prestes a ser removido por qualquer caçador.

6/4/2008

Luiz Celso de Matos
Enviado por Luiz Celso de Matos em 10/05/2008
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