Choro Seco

Sozinho. A aglomeração de corpos celebrando o retorno de quem nunca foi, verdadeiramente, não me comove. Por mais que conheça o suspiro de quem me saúda, sou engolido pela dúvida e me dopo em pensamentos. Por onde estive? O que aprendi? Assimilara a dor como aprendizado ou somente me tornara mais fraco? Do que fujo? Talvez do soco que, no primeiro instante, nos priva de ver para depois nos ensinar a enxergar.

Na verdade, fujo do amor. Fujo do sentimento que grampeia corpos e impede o vôo das almas. Fujo do comprometimento perverso que estipula os passos quando os pés ainda nem tocaram o chão. Fujo da dor que vem junta.

Conheço a felicidade, mas do jeito como foi cravada em meu peito noviço. Sonhos, olhos brilhantes e sorriso largo faziam parte do pacote. O que é ser feliz hoje? Fincar as garras no peito alheio até que linhas de sangue alertem para a crueldade dos gestos? Calar o grito de socorro arruinando ambos os destinos? Percebo que o amor alimenta os fracos assim como a felicidade comove os tristes. Tudo de mentirinha.

Voara nos pensamentos, tornando o tempo figurante, quando percebera o delicado abrir dos seus olhos.

- Oi.

- Oi.

- Dormiu bem?

- Dormi.

- Você me ama?

- Amo.

Desvencilho-me do seu corpo, alegando calor, e lhe dou as costas, ainda na cama. Miro o espelho na parede e me envergonho do reflexo.

...não tente entender o amor.

Felipe Valério
Enviado por Felipe Valério em 23/01/2006
Reeditado em 14/11/2006
Código do texto: T102878
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