VIVA SÃO JOÃO!!!

Meu bairro está em festa entre estampidos de bombas, fumaça de fogueiras e o brilho dos folguedos que cortam o céu, hoje mais estrelado que as demais noites do ano. É véspera de São João. Tudo deveria ter mais emoção. A curtição parece estar muito boa lá fora... Recolho-me ao silêncio, pois as explosões de bombas (a cada ano ficam mais potentes) e os buscapés me assustam pra valer!

Uma vez isolado de tudo e de todos, minha curtição passa a ser a audição de alguns forrós pé-de-serra, no meu próprio pc. Ah, como é bom ouvir Luiz Gonzaga, Marinês, Dominguinhos, Trio Nordestino... e por aí, vou misturando outros ritmos, outras vozes que me emocionam, como a do bom e inesquecível conterrâneo Jackson do Pandeiro!

Lá fora continuam as explosões dos fogos... e me vem a leve fumaça das fogueiras, misturada com vozes de pessoas envolvidas diretamente nos festejos, que curtem outros tipos de forrós, tão bem percebidos pela minha audição: forrós eletrônicos, onde a letra soa estranho para mim. Letra sem vida, São João sem vida, explosões em sentido, vidas próximas-distantes, festejo por festejo. Nada contra, mas esse pessoal vem perdendo cada vez mais o verdadeiro sentido das festividades juninas.

Ah, me chega agora as memórias dos festejos antigos do meu bairro... Como era legal aquele tempo! Lá sim, a vida tinha mais sentido, as pessoas se confraternizavam de verdade, estavam mais próximas umas das outras, o som era genuinamente junino, as quadrilhas tinham um colorido no vestuário e na dança que combinavam com a essência do período festivo... Falta isso hoje. Não que eu seja totalmente saudosista, mas o tempo era aquele. Éramos felizes e não sabíamos!

Lembro-me bem dos antigos festejos no meu bairro: as ruas todas enfeitadas de bandeirinhas. Um mês inteirinho assim ficavam e todos ficavam de olho para que ninguém desorganizasse, com exceção de algum caminhão que passava e levava a metade das bandeiras de ambos os lados da rua. Na véspera e na noite de São João, as ruas repletas de fogueiras, o milho assado na fogueira, as simpatias, o compromisso assumido entre comadres e compadres de fogueira... Até uma afilhada de fogueira eu tive num desses anos.

O verdadeiro encanto da tradição junina está desaparecendo. Só agora percebo porque estou tão isolado assim. Comemorar o quê? Sair não posso, pois estou isolado entre bombas potentes e buscapés que, por maldade, soltam de rua afora sem respeitar que vai passando, colocando em risco crianças, adolescentes, jovens, adultos e anciãos.

A contemporaneidade, a falta de educação e de cultura no nosso país, vem destruindo todas as tradições culturais. É uma pena.

Mesmo assim ainda resta-me forças para gritar (meio sufocado) um: "Viva São João"!

André Filho Guarabira
Enviado por André Filho Guarabira em 23/06/2008
Reeditado em 13/10/2023
Código do texto: T1048175
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