Um dia, daqui a 1000 anos vão dizer que um homem bom foi assassinado numa Igreja

Um dia, daqui a 1000 anos vão dizer que um homem bom foi assassinado numa Igreja

“Há coisas pelas quais vale a pena lutar apesar do mundo cruel e selvagem onde vivemos”

Existe mais ou menos a meio de França (a cerca de 400 km de Paris) desde há aproximadamente 60 anos uma comunidade religiosa de caris católico fundada pelo Irmão Roger, mas que se caracteriza pelo seu ecumenismo e multiculturalismo. Durante praticamente o ano inteiro lá são aceites jovens e alguns adultos de ambos os sexos durante períodos que variam de uma semana a 1 mês. Pagam uma quantia simbólica pela estadia, mas também trabalham em diferentes tarefas através das quais permitem o funcionamento da comunidade. Existem espaços de oração e de reflexão, mas sobretudo o objectivo da comunidade é uma certa interioridade, reflexão que atrai pessoas de todos os credos, ou sem credos como é o meu caso. Os Irmãos que presidem a este espaço não aceitam qualquer tipo de donativos, sendo que a comunidade é sustentado pelo seu trabalho ou por produtos que se vendem lá quase a preço de custo.

Não é raro existirem mais de 7 mil pessoas a conviverem sem qualquer tipo de distúrbio.

Há noite há um espaço de convívio onde o álcool é controlado, não sendo permitida a ingestão excessiva de bebidas alcoólicas e vedado o uso de drogas. Das 21;15-23;30h convive-se intensa e saudavelmente com pessoas de outros países, sendo que os laços lá criados chegam a durar a eternidade das nossas vidas e reforçar a solidariedade entre as nossas nações. Eu, um boémio assumido confesso que algumas das melhores dias e noites que passei na vida foram em Taizé, e apesar de gostar de me deitar tarde, quando chega a hora de recolher faço-o sem grandes dificuldades, pois afinal há que acordar cedinho para trabalhar para o bem da comunidade.

No dia 16 de Agosto de 2005 aproximadamente pelas 21h houve uma morte numa Igreja

Não foi uma morte qualquer.

Este acto hediondo foi perpetrado por uma mulher perturbada que esfaqueou um homem notável, o líder e fundador da comunidade de Taizé, o Irmão Roger, um ancião na casa dos 90 anos.

Não havendo segurança policial foi detida numa sala onde era perfeitamente visível e depois esteve algumas horas num carro de polícia (entretanto chamada) à vista de várias centenas de pessoas. Apesar da revolta e da enorme dor, não houve qualquer tipo de acto hostil contra a assassina. Por toda a comunidade nas horas, dias, anos seguintes viveu-se uma enorme calma e tranquilidade, exemplo do espírito de Taizé para a humanidade.

Eu estava a apenas algumas dezenas de metros da Igreja e indirectamente vivi o assassinato (alguns amigos meus estavam perto do Irmão e assistiram a tudo) e directamente os acontecimentos que se passaram a seguir. Sofremos como irmãos e como irmãos ultrapassámos a morte, uma lição que ficará para o resto das nossas vidas, por muito curtas ou longas que estas sejam.

Nesse dia, soube mais tarde, morreram 150 pessoas num desastre de avião. “Nesse dia a estrada para o céu estava cheia de anjos”.

Um dia, daqui a 1000 anos vão dizer que um homem bom foi assassinado numa Igreja

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