À Solitária....

Da varanda via a rua, contemplava as estrelas esperando, talvez, um milagre cair do céu, sonhava acordada com algo que desejava muito. Os carros passavam pela rua rumo a seus destinos, e sua vida ia seguindo sem cor, esperando um amor que só conhecia de sonhos, livros ou canções. Olhava cheia de esperança ao ver um casal, cujo brilho dos olhos podia ser notado a distancia, o afeto das almas é invejável ao solitário que, consternado, quase sente o âmago apertando sobre si, enternecido suspira.

Ninguém via ali, seus olhos perdidos, nem dó nem coisa alguma, ignorada a pobre moça cheia de ternura respirava fundo, tentando se manter de pé.

A manhã chega sorrateira, ilumina seu mundo, seu esconderijo se ilumina, e o carteiro traz a correspondência pouco esperada. Os dedos passam por contas e por propagandas, até parar em um envelope branquíssimo, com letra bem feita, dedicada à sua pessoa, deixando a duvida no ar. Abre avidamente, sem notar não haver selo ou carimbo, o remetente está sem nome, mas não liga, nada importa. A letra era bela, masculina em essência, forte. Dizia:

“Moça da varanda,

O que contempla com tanta tristeza, quem te permite ser tão só, com tanta beleza eu te ocuparia todo o tempo, se fosse permitido a ti refletir, seria a meu lado, tiraria a tristeza lânguida de seus olhos e daria a seus lábios sorrisos, e daria mais cor à sua sala, tão pálida... Espero que responda-me a causa de suas tristezas...

Abraços

O Padeiro”

Padeiro? Era cômico, o único da padaria era um senhor de uns 70 anos! Seria quem se condoia de suas dores, e queria, ousadamente, fazê-la feliz?

Foi à padaria na hora, como era de se esperar, chegou devagar, e viu, assobrada, um mural do bairro, todos deixavam recados uns pros outros, pois havia 3 comunidades no local, de grupos de crescimento e de convivência. Um dos envelopes tinha escrito “Ao Padeiro”, seria aquilo?

-Senhor Lourenço, aquele envelope e pra deixarem recados pro senhor?

-Não menina linda –sorriu com suas rugas de cera, e sua delicadeza de sábio- algumas pessoas se deram apelidos, este não sei quem é, mas não sou eu...

Subiu as escadas tropeçando, o coração batendo depressa, a cabeça cheia de esperanças, não importava quem fosse, ia levar aquilo à frente.

“Observador atento,

Contemplo o que me cerca justamente por solidão, não tenho quem me dê companhia nem emoções, vivo só em uma nova realidade, vinda de lugares distantes pousei aqui, onde encontrei meio de sobreviver, porém, vivo distante do que conheço, daqueles que tenho afeto, estou aprendendo a estar aqui...

Por que padeiro?

Abraços

Moça da varanda”

À noite, ficou a ver o movimento da rua, mas buscava os olhos que a viram um dia, daquele que perdera seu tempo escrevendo algo a ela, viver longe de sua antiga vida era ruim, lembrava de seus amigos, de seus parentes, sua cidade agora era um ponto longe até mesmo no mapa, fazia aquilo para que estudara, mas estava sozinha...

No dia seguinte era a única carta, o mesmo envelope branco, a mesma letra:

“Moça da varanda,

Triste saber de sua solidão, que este lugar não te cabe como lar, mas digo, moça linda, que aqui as pessoas são sociáveis, aproxime-se das comunidades, há um afeto que se mantêm neste lugar, aprendendo juntas a plantarem amor, e respeito, sou um multiplicador, espero que venha conhecer um de nosso projetos, seria uma honra tê-la conosco.

Abraços

O Padeiro”

Aquela propaganda de comunidade quebrou toda a emoção de um observador atento, exclusivo, ele estava apenas fazendo seu trabalho? Se recusava, agora, a continuar dando emoção aquilo, nem pretendia responder, ia trabalhar sem culpa, sem peso, ele deixou de ser possibilidade e se tornou algo de banal, quase comercial...

O dia, transcorreu com a mesma cor pálida de sempre, sem sentido ela caminhou até o prédio, ficou andando com passos lentos e viu a sede da comunidade, onde o grupo de pintura sorria com seus pinceis. A cor das paredes de tijolinhos, os adornos metálicos das paredes, parecia um atelier e não um centro comunitário de um bairro, era um bairro classe media, mas de todo modo, parecia fora do contexto de Brasil... Entrou cheia de duvidas, foi atendida por um deus mitológico de tez morena e sorriso de marfim:

-Gostaria de saber...-gaguejou insegura- que tipo de cursos, oficinas e afins tem aqui...

Sorriu com todos os dentes e mostrou varias opções, disse da importância daquele grupo que ajudou muitas pessoas que sofriam de depressão no bairro, diminuiu o índice de violência pois a cooperação na vigilância deixou os bandido acuados, e muito mais, ela ouvia deslumbrada, começaria na semana seguinte um curso de pintura em tela.

Continua

T Sophie
Enviado por T Sophie em 15/10/2008
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