Codornas

CODORNAS

Havia naquele sujeito algo que incomodava as pessoas – um ar de constante lubricidade, enxergando sexo em tudo que o rodeava, tornando-se um pouco inconveniente. Por se preocupar apenas com isso, seu linguajar limitado arrotava vantagens de sua performance na cama ou fora dela. Solteiro aos trinta e nove, só pensava nas conquistas para contá-las aos amigos de bar no final de semana. Chamava as mulheres, quaisquer delas, de “anjo”; de tanto chamá-las assim, às vezes escorregava e chamava também um amigo de anjo – ele próprio tomava cada susto...

Seu costume, ao término do trabalho, era vagar pela periferia à caça de aventuras, descobrir algo novo que não simplesmente a prostituição fácil. Nesses lugares, desconhecido, estava disponível e à vontade para encontros sem a incômoda presença de algum conhecido ou amigo. Gostava do novo, do inusitado, este o excitava mais que a conquista fácil.

Vagava nas imediações de uma nova e longínqua rodoviária em construção onde já se instalavam alguns bares e lojas de artigos baratos, quando uma loira o chamou a atenção. Sozinha, desceu de um carro modesto, comprou alguma coisa numa farmácia e saiu, fumando, sem olhar para os lados. Entrou no carro mostrando as generosas pernas que a curta saia com pregas não conseguia esconder. Quando ia engatar a marcha, olhou para ele e, com o dedo, o chamou.

Não quis acreditar que uma mulher como aquela pudesse lhe dar aquela atenção. Mas, o que ela queria era apenas uma informação, a localização de uma rua próxima. Mesmo na imbecilidade dos pasmos, teve a presença de espírito de dificultar um pouco a informação, acabando por pedir para entrar que ele mostraria a rua para ela. Quando entrou no carro, não perdeu tempo com pormenores, imediatamente elogiou sua beleza e, mesmo antes de perguntar-lhe o nome convidou-a para sair. Ela passou a mão em sua perna levemente, não disse palavra, mas nem precisava, depois dirigiu o carro e entrou no motel próximo.

Mais espanto! Era a primeira vez que se anunciava um programa tão imediato com uma mulher tão atraente. No quarto, no entanto, não se sabe se por culpa da situação inusitada, fracassou. Nem o ambiente de pouca luz, o perfume dela, a música suave e alguma bebida adiantaram. Desistiram, ele pegou o número do telefone da loira e ficou de ligar dia seguinte.

Desta vez não contou a aventura para ninguém, a não ser para um único amigo em quem confiava. Para este, disse que tal fracasso na cama nunca antes havia acontecido – frisou - , deveria ser tratado como segredo muito bem guardado. O amigo sugeriu que comesse ovos de codorna - era tiro e queda, não havia quem não desenvolvesse uma invejável performance após comer alguns deles. Aceitou o desafio, comprou várias caixas, comeu meia dúzia de uma vez, crus – foi premiado com uma boa diarréia. Mas não desistiu, recomeçou tudo, desta vez com parcimônia, até que comprou um casal de codornas e iniciou uma criação. Sentiu que as coisas estavam melhorando e decidiu telefonar para a loira e marcar novo encontro.

No encontro em motel de classe, com todos os requisitos que o salgado preço proporciona, novo desastre. O problema é ela com essa beleza estonteante, pensou. Sua única esperança foram os ovos. Voltou para casa cabisbaixo e envergonhado, logo ele que nunca havia falhado, que vivia contando aos seus amigos que fazia coisas que eles nem imaginavam...

Decidindo compartilhar com a loira seu desgosto, contou-lhe da experiência dos ovos de codorna. Com a inesperada compreensão dela, convidou-a à sua casa e comeram as codornas assadas no jantar. Aí, então, aconteceu a performance esperada.

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Samuel Medeiros
Enviado por Samuel Medeiros em 27/01/2009
Código do texto: T1406543
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