FRUTINHAS NO CAFÉ DA MANHÃ

Bem, hoje a distância entre os povos é consideravelmente pequena... Podemos tomar o café da manhã no Brasil e a noite saborear um choco frito, ouvindo um fado numa tasca em Portugal. Isto é fato!

Porém, há uns 20 anos, mesmo no pequeno estado das Alagoas, a coisa não era bem assim, a comunicação era difícil, tanto devido à distância física quanto a cultural e, até o acesso a determinados produtos naturais ou industrializados, era complicado.

Naquela época morávamos numa pequena cidade do interior do estado, mas precisamente no sertão alagoano – São José da Tapera. Era praticamente uma aldeia, todos se conheciam e eram aparentados.

O comércio local, quando muito, ofertava apenas os produtos básicos e de subsistência. Algo diferente só poderia ser adquirido nas cidades de maior porte.

Em 1989 abriram-se as inscrições para um concurso público na Secretaria Estadual de Saúde, várias pessoas prestaram exames e oito, da nossa cidade, foram aprovadas, inclusive eu.

A princípio iríamos trabalhar no hospital que prestava serviços a população residente na área da Hidroelétrica do Xingó, entretanto, fomos designados a exercer nossos ofícios em uma unidade de saúde na região agreste do estado, na também pequena cidade de Girau do Ponciano.

Girau do Ponciano fica nas proximidades de Arapiraca, que sendo a segunda maior cidade do estado de Alagoas, tem todo progresso e comodidades que um centro urbano pode proporcionar, extensivo às adjacências.

Só poderíamos solicitar transferência de local de trabalho após cinco anos de serviços prestados ali, motivo pelo qual eu e mais duas colegas optamos por mudarmos definitivamente para Girau do Ponciano.

Os outros cinco permaneceram morando em São José da Tapera. Trabalhavam apenas um plantão de 24 horas semanais, assim podiam, sem transtornos, continuar em seu local de origem.

A turma era bastante ligada e toda semana nos reuníamos em casa de um dos três que já tinham residência fixa na cidade. Normalmente era um almoço ou jantar, que servia para estreitarmos os laços e colocarmos os assuntos em dia. Havia dois colegas que se destacavam dos demais: Manoel Messias era o mais animado e Luís Barros a vítima preferida para os escárnios e tiradas.

Determinado dia, em uma destas reuniões, falávamos em especiarias do café da manhã, inclusive sobre a importância da ingestão de frutas e sucos naturais, para uma dieta balanceada.

Todos sabiam que, na época, o sertanejo consumia pouca fruta e quando o fazia era no almoço ou lanche, até porque não era cultura da região o consumo de frutas no café da manhã. Hoje não podemos afirmar isto como verdade, todos têm acesso a tudo...

Luís Barros era um fazendeiro bem sucedido, mas vivia modestamente com a família e seu lema era: gasto zero e tirar vantagens de tudo... Também não era segredo que jamais gastaria seu rico dinheirinho com frutas ou outros alimentos senão os básicos. Hoje ele está mudado... Aprendeu a usufruir dos benefícios que o dinheiro pode proporcionar.

Bom, voltando às frutas e sucos... Quando o assunto foi abordado o Luís, que não costumava ficar calado, sempre tinha algo a dizer sobre tudo, caiu na besteira de abrir a boca e soltar a dele:

- Isto é verdade. Lá em casa nós sempre consumimos frutas e sucos no café da manhã...

Ao que Manoel Messias, muito irritado com o aparte, retruca:

- Ah, sim... As frutinhas do seu café da manhã são: umbu, pitomba, ouricuri... E o suco deve ser de quixaba!

Ninguém agüentou, foi uma gargalhada só. Luís ficou vermelho, todo sem graça e foi embora aborrecido. Até os dias de hoje temos que tocar no assunto com delicadeza, pois ele fica deveras contrariado.

Cabe ressaltar que, como na maioria das zonas rurais, havia e ainda há diversos tipos de árvores frutíferas como também frutas nativas e exóticas, pouco utilizadas pela população, a exemplo da pitomba, umbu, cajá, quixaba e ouricuri... Estas eram consumidas apenas por pessoas desprovidas de recursos materiais e sem condições de dispêndios.

Ceiça Lima
Enviado por Ceiça Lima em 23/05/2009
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