SALADA DE FRUTAS

Há alguns anos trabalhávamos em turnos de 24 horas, imagine você passar um dia e uma noite, trancando numa sala. Há de se ter muita paciência e criatividade para suportar.

O plantão de sexta-feira era o melhor da semana. A turma era bem legal. O Dr. Vasco, médico plantonista, era um ser humano espetacular e quando ele chegava a tristeza ia embora.

Ele sempre nos dizia que tinha 60 anos, todos acreditavam afinal ele era nosso amigo... O fato é que ele tinha os sessenta quando foi trabalhar lá e continuava com os mesmos, quatro anos depois, quando saiu... Digamos que ele era razoável quanto a questões de idade.

Durante o dia e até umas onze horas da noite o plantão era movimentado, mas daí adiante era bem tranqüilo e dava para descansar e, às vezes, até dormir um pouco.

Normalmente assistíamos a algum filme ou show antes de nos recolhermos. Só tinha aparelho de televisão no quarto de repouso dos médicos e era lá que nos reuníamos para relaxar, jogar dominó e também bater um papinho.

Combinávamos anteriormente o lanche da “sessão coruja” e, neste dia, fiquei responsável pela bendita salada de frutas. Como a minha vida era muito corrida, não tinha tempo de ir ao supermercado, pedi à moça da copa que comprasse os ingredientes necessários e, por favor, preparasse deixando no refrigerador da cozinha que na hora devida eu pegaria – a cozinha ficava fechada durante a noite, mas eu tinha as chaves. Tudo certo e lá vamos nós, relaxar um pouquinho.

Todos se acomodaram no minúsculo cubículo improvisado por quarto. A mobília era composta por um frigobar, uma poltrona e a cama. Pegávamos duas cadeiras “preguiçosas” nos outros aposentos e organizamos o ambiente. Ficava apertadinho, mas todos se ajeitavam. Carlos e Maria sentaram-se no chão, Cleane e Gigi nas preguiçosas, o doutor estava recostado na cama e eu fui buscar a famigerada salada de frutas na cozinha.

Concluindo... Quando entro no quarto com a tigela nas mãos, tropeço no pé de alguém e me desequilibro. A bendita salada, num vôo fantástico, vai cair em cima do doutor e se espalha por toda a cama, respingando para todos os lados, sem deixar ninguém impune.

Foi aquela confusão. Por sorte o doutor tinha roupas limpas no carro, mas reclamava muito por ter de tomar banho àquela hora e o chuveiro não ser quente. Como tinha sido o mais atingido, não teve para onde correr a não ser para debaixo do chuveiro e nós, os outros, limpamos tudo rapidinho e trocamos a roupa de cama.

Assistimos, depois, ao filme... Só não foi possível comermos a salada de frutas e dormir um pouquinho, pois o doutor Vasco, medroso como ele só, recusou-se a ficar sozinho no quarto temendo que aparecesse algum inseto ou roedor por debaixo da cama... É que tivemos que virar o colchão.

O mais constrangedor foi, no dia seguinte, me justificar perante a direção o porquê da necessidade de um colchão novo para aquela cama...

Ceiça Lima
Enviado por Ceiça Lima em 25/05/2009
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