Engenheiro Mendigo (Parte II)

Traição

Eu trabalhava obstinadamente numa companhia, sem férias, e muitas vezes sem finais de semana... Meu único laser era leitura de livros e revistas que me ajudariam a construir uma carreira absolutamente brilhante. Ou, happy-hours com gente influente que podia me ajudar a subir ainda mais rápido os degraus do sucesso. Casei-me com a mulher perfeita: rica, linda e gostosa. E educada e culta de forma a poder receber até mesmo um rei na minha casa sem passar vergonha. Mas o melhor de tudo era que ela me amava, assim como eu a amava! Fomos o casal mais invejado nos meus círculos sociais.

Eu estava tão certo de estar fazendo as coisas certas, nas horas certas... Se não parava em casa para uma televisão, ou não ia aos cinemas aos domingos, se quando estávamos em casa eu trazia sempre os seletos amigos que podiam me ajudar na minha carreira... eu tinha o consentimento e apoio da minha amada esposa.

Mas, então... No décimo aniversário do meu casamento, eu resolvi pela primeira vez quebrar o hábito e comemorar a data a sós com ela. Seria uma surpresa... Encomendei um buffet a dois a ser entregue no dia, comprei flores, jóias e vestidos. Cheguei ao meu apartamento de tardinha. Esperava encontrá-la... não sei o que esperava que ela estivesse fazendo, eu nunca perguntei a ela o que gostava de fazer enquanto eu não estivesse com ela.

Eu a surpreendi no quarto arrumando-se para sair. Enquanto escolhia o vestido para colocar, ela falava ao telefone. Ela combinava um encontro! Como que atingido por um raio, eu me afastei da porta, com ouvidos aguçados para entender direito o que ela falava. E assim descobri que ela pretendia me abandonar, mas não sem antes me roubar. Tudo que eu havia ganhado com o meu trabalho, ela estava transferindo para o seu nome. E enquanto a operação não se completasse, ela e o seu parceiro deviam ter paciência...

Saí do apartamento completamente zonzo, me escondi num táxi e a segui. Ela entrou num restaurante e de lá saiu com um jovem desconhecido. Sem perder a calma, mas cego de raiva e dor, eu os abordei no meio da rua, sem saber o que iria dizer ou fazer. E a minha dor ficou insuportável quando ela se postou entre mim e o jovem que me fitava mortalmente pálido. Ah, minha amada esposa! parecia uma leoa defendendo a sua cria. Mas, como gente civilizada que somos, apenas falamos... Eu ouvi da sua boca a confirmação da sua traição. Ela me declarou que não mais me amava, que queria a separação, que não me suportava há anos!... O que eu podia dizer-lhe em troca? suplicar que ficasse comigo? forçar-lhe a lembrança do quanto nós juntos lutamos para ter o que havíamos conseguido? Ah, mas ela não se lembrou... a luta era somente minha, segundo ela. Ela não precisava de iates, fazendas, casas de campo ou de praia... só precisava de atenção, e eu nunca estava com ela. Acusei-a de jamais ter falado sobre isso antes... por que ela não falara comigo? Mas, ela se calou, é perda de tempo explicar, disse. A conversa civilizada havia terminado. Ela me deixou lá, plantado no meio da calçada, e abraçado com o seu amante se afastou no seu carro... que eu lhe havia comprado!

Assim eu, por minha vez, me afastei dali. Voltei ao nosso apartamento a que chamei de lar por tantos anos. Mandei o buffet de volta, enfiei os presentes que havia comprado num saco de lixo, peguei o meu carro e saí vagando por aí. Não queria encontrar a ninguém... Quando percebi, estava numa estrada deserta rumo não sabia aonde. Deixei o carro me dirigir, eu não estava ali.

(continua...)

Clary
Enviado por Clary em 30/05/2006
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