CARNAVAL

CARNAVAL

Hoje acordei no horário de costume, as seis da manhã. Já não durmo quando tinha, 20 ou 40 e até 50 anos, minhas noites tem sido encurtadas para o sono. Levanto faço o café, o qual aprendi bem tarde a faze-lo, até pouco, Maria é quem fazia. Alias tudo fazia, eu não sabia nem fritar ovos, quem dera então cozinhar o básico, feijão, arroz e bife. O pão costumo buscar mais tarde na padaria do seu Nico, mesmo porque nesta refeição e nas outras a única companhia que tenho é Marcellus um gato que ganhei de minha neta, Sonia que pouco a vejo. O nome do bichano foi uma de minhas distrações. Busquei no baú velho, as revistas de um semanário dos anos 50, intitulado Cinelândia. Lá comecei a procurar nomes de personagens de fitas da sétima arte. Encontrei em o Manto Sagrado. Era o nome do Centurião Romano, interpretado por Richard Burton. Este filme é um de meus favoritos, o preservo em VHS, uma das cópias que fiz nos anos 90, antes do advento do DVD.

Há anos que minha rotina tem sido, a de após o café e a compra de pães, ir a banca de jornal localizada no farol de cruzamento de duas avenidas, e papear com os “velhinhos”, meus amigos de conversas, sobre o Palmeiras, a falta de dinheiro, a Aposentadoria de fome, as dores físicas e só. Nem sei porque freqüento estas rodas, elas colocam qualquer sujeito no maior baixo astral. Mas prosseguindo a vidinha (que não pedi a Deus). Depois dos papos pra lá de entendiantes, faço um ritual desnecessário. O de ir até o banco onde recebo minha aposentadoria e retiro o extrato da conta. Só um dia do mês ela tem saldo, mas me diverte o fato de nunca ter dinheiro. Antigamente me revoltava este fato, pois pensava que políticos e patrões ganhavam rios de dinheiro explorando os pobres mortais. Porem me da alivio de consciência, pois tudo o que ganhei e ganho foi com honestidade e muito trabalho. Volto para casa, da mesma forma que fui. Ônibus, graças ao beneficio da gratuidade para os mais de 65 anos de idade. Chego e esquento o que sobrou da janta no único pertence que sobreviveu, após a ida de minha esposa, o microondas. Assisto esportes do meio dia, fico entristecido com a ignorância de nossos meios de comunicação, que não informam, deformam. Depois, me resta a Sesta, que não dura mais que quinze minutos. Fico mais tempo na cama, mas de olhos bem abertos, pensando o quanto minha vida é interessante. No fim de tarde, recebo uma visita, é a vizinha, que passa minhas roupas. Ela é viúva, conservada e acho que me procura todo dia, para um romance. Finjo que nada vejo. Pra falar a verdade, não me interessa, desde..... A vizinha fica o tempo suficiente, para que eu a dispense com desculpas do tipo, preciso tomar banho(quando é visível que já o fiz), ou vou sair (estou quase sempre de pijamas neste horário). E pra terminar, talvez o único prazer: Ler as obras de Garcia Márquez. Seus escritos principalmente, Amor nos Tempos do Cólera e Memórias de Minhas Putas tristes, falam de recomeço ou um novo começo para o velho.

Estas leituras, não servem para nenhuma lição ou dica de futuro. Mas são nelas que encontram o Nirvana. Chego a ter ereções, ao imaginar a putinha de memórias ou a Fermina do cólera. O ambiente épico e latino Americano de Garcia Marques, contribuiu para um erotismo, desprovido de pornografia, mas cheio de malicia e sacanagem. Isto me faz recordar as noites de caricia e ternura, com minha Maria. A primeira, foi temida e tímida, até apressada. Mas com o tempo, parecíamos dois personagens do Kama Sutra. Ela me completava, ao me deixar entrar dentro, vivíamos uma explosão de cosmos e estrelas. Os suores e o cheiro de porra, davam o perfume de nosso coito. Deixo o livro e termino me masturbando e chorando.

Mas hoje, parece que não to afim de cumprir a jornada diária. Algo me picou.

Faz dez anos, que Maria partiu. Fiquei literalmente encerrado em casa, durante dois anos. Não saia pra nada. Minha filha é quem trazia comida, roupa lavada, a qual não comia e não trocava. Queria morrer, não me matar, sou cristão. Um dia vi que a melhor forma de me juntar a minha amada é viver e não viver. Fazer as coisas mecanicamente, cair na monotonia sem motivo algum. Mas me dou conta neste momento que apesar da tristeza, não estou a morrer. Percebo que ao contrario do que pensei, algo me dá energia para continuar. È como se cada coisa que faço, é o sentido perdido á uma década.

Um fogo sai de minhas entranhas, percorre o sangue em minhas veias. To renascido? Não sei. Só sei que não quero partir, nem espiritualmente, nem tão pouco carnalmente. Sacudir a poeira? Não sei. Fazer algo diferente? Casar? Não sei de nada, ainda. Só sei que quero viver, buscar o caminho das pedras, das montanhas, dos mares. Buscar o caminho da volta, do passado, presente, futuro.

Hoje 23 de Junho, completo Setenta Carnavais e é isto que quero na vida: CARNAVAL.

Começar De Novo

Ivan Lins

Composição: Ivan Lins / Vitor Martins

Começar de novo e contar comigo

Vai valer a pena ter amanhecido

Ter me rebelado, ter me debatido

Ter me machucado, ter sobrevivido

Ter virado a mesa, ter me conhecido

Ter virado o barco, ter me socorrido

Começar de novo e só contar comigo

Vai valer a pena ter amanhecido

Sem as tuas garras sempre tão seguras

Sem o teu fantasma, sem tua moldura

Sem tuas escoras, sem o teu domínio

Sem tuas esporas, sem o teu fascínio

Começar de novo e só contar comigo

Vai valer a pena já ter te esquecido

Começar de novo...

EM TEMPO: Este texto é dedicado ao meu Pai, que fez 70 anos no dia 23 de Junho.

dialetico
Enviado por dialetico em 26/06/2009
Código do texto: T1669051