Um dia de sorte

Stella acordou com a sensação de que estava atrasada. E estava mesmo. O relógio simplesmente não despertara. Não que ela tivesse que chegar rigorosamente no horário mas era porque, um pouco mais tarde a condução ia superlotada. Infelizmente ia ser preciso encarar e rezar forte para conseguir um lugarzinho para sentar. O banho foi rápido, o café, mais rápido ainda e lá se foi Stella para o ponto de ônibus. Deu sorte pois o ônibus não demorou a aparecer, e, mais sorte ainda porque estava meio vazio. Com certeza era o seu dia de sorte. Sorriu mentalmente ao pensar que deveria agendar esse dia 14 de agosto como um amuleto. Tirou o dinheiro já previamente separado para a passagem, passou pela roleta e sentou-se sozinha num banco, lado da janela. E o ônibus ia ligeiro pelas ruas estreitas, parando, pegando passageiros e partindo apressado. Numa das paradas entrou um sujeito grandão, com cara de poucos amigos e sentou-se ao lado da Stella, que sentiu algo estranho. A moça, que tinha o hábito de seguir suas intuições, disfarçou e deu uma olhada para os fundos do ônibus para ver se tinha alguma cadeira vazia. Tinha. Hoje era mesmo o seu dia de sorte, não precisava nem ler o horóscopo. Ela apertou a bolsa contra o peito, levantou-se, pediu licença com uma voz quase sumida e acelerou . Sentou-se ao lado de um rapazola bem vestido, que lia uma revista, displicente. Stella desarmou-se e sacou uma “seleções” da bolsa e foi fundo na leitura. Em dez minutos chegaria ao ponto de descida. Tão distraída estava que sentiu um leve cutucão na cintura mas nem ligou, hoje era seu dia de sorte e com certeza tinha sido só um movimento desajeitado do rapazinho ao lado. Foi quando ouviu o sussurro:

- Caiu

- Caiu o que, rapaz? – perguntou a moça, meio surpresa.

- Você caiu. Passa a grana, depressinha

Stella estava atônita, afinal, era o seu dia de sorte, não podia estar acontecendo aquilo. Mas, seguro morreu de velho e a moça obedeceu, trêmula e olhando para o chão. Nem viu quando o rapaz se levantou e saiu andando calmamente. Também não viu a chapuletada que o indivíduo recebeu na nuca, quando passou pelo sujeito mal encarado de quem Stella desconfiara. Não viu mas ouviu, o catiripapo e a frase.- Polícia, Teje preso . Era mesmo o seu dia de sorte. Stella esqueceu a instintiva antipatia e sorriu para o policial mal encarado que lhe estendia a carteira roubada. Stella segurou a carteira e a mão estendida e, impulsivamente deu um beijo no rosto do homem, que abriu um lindo e luminoso sorriso. Caraca. Era mesmo o seu dia de sorte.