O Gole de Cerveja

Quem nunca sentiu ciúmes nessa vida? Talvez quem nunca amou. Pensando bem, mesmo quem nunca amou com certeza já sentiu ciúmes, de alguma forma ou outra.

Teobaldo vivia esse dilema. Sempre à mesa de bar encontrava-se sob aquele estado de melancolia, uma tristeza profunda incomodava à alma daquele pobre senhor, que despertava em todos uma espécie de compaixão. Por vezes suspirava, parecia que não ia suportar, todos se comoviam. Pobre Teobaldo!

Cada gole que se sucedia carregava um pouco de remorso e um certo sentimento de culpa. Ele não era um cara ciumento, não existiam dúvidas quanto a isso. Não era um homem muito bonito, a idade já o havia castigado um pouco, casado com uma mulher maravilhosa, deslumbrante. A esposa de Teobaldo era um verdadeiro espetáculo e mesmo assim Teobaldo não tinha nenhum ciúme dela, que era cantada, cobiçada, disputada, a tapas muitas vezes, por todos. Era impossível resistir a tanto charme.

Pois que sempre tinha alguém carregando uma sacola pela rua, ajudando na feira, ou mesmo com alguma palavra de conforto para esposa de Teobaldo. Ele parecia não se importar. Não tinha ciúmes dela porque confiava no seu taco. A verdade é que ela nunca o traíra, ou se o fizera, ninguém havia sabido. Se por acaso ele perguntasse a ela, negaria sempre. Dinheiro não tinha para contratar um detetive, e pra que? Pra descobrir o que não queria? Todos os amigos o aconselhavam, diziam que sua mulher era muito bonita, que o melhor mesmo era ficar de olho bem aberto, mas não era mesmo o caso.

Estava tudo muito bom do jeito que estava. Quer dizer, estaria melhor se não fosse o ciúme, doentio, que sua esposa tinha por Teobaldo. Talvez o motivo de tanto ciúmes era a falta do mesmo que ele dispensava a ela.

A rua onde morávamos era memória de muitos escândalos originados por sua esposa. Quase sempre gritava, “você deve ter outra, mas se tiver eu vou descobrir”, gritava sempre com muita fúria.

Teobaldo?!

Quem ia querer aquele sujeitinho? Era uma pessoa boa, honesta, quase sempre que podia, claro. Não era uma pessoa ruim de forma alguma. Mas o fato é que ninguém entendia o que uma mulher como aquela, que poderia ter qualquer homem aos seus pés, tinha visto naquele pobre homem. Porque ele não tinha nada que pudesse atrair uma mulher como aquela. Não digo que ele não a merecesse... Isso causava, obviamente, certo desconforto em boa parte dos amigos. Indignação por muitos é verdade. Vê-lo melancólico com uma mulher daquelas então, era quase uma afronta.

Pobre amigo, bebia sua cerveja. Sabia que isso não agradava a patroa, mas, bebia mesmo assim. Sofria a cada gole. Na roda de amigos era freqüente ouvir, “larga essa mulher Teobaldo, cara!”, “nenhuma mulher por mais bonita que seja merece isso”. Teobaldo não sabia até onde os amigos sentiam pesar e queriam o seu bem, ou até onde eles queriam o caminho livre pra flertar com sua mulher e queriam o seu bem, para eles. Ele apenas dava mais um gole.

Fim da tarde ia pra casa, enfrentar a fera. Quem vai entender o amor? Sua esposa, uma mulher com as medidas milimetricamente desenhadas, podia escolher o homem que quisesse, mas queria Teobaldo. Ele, apesar da sua ausência de qualquer coisa, dono de uma infelicidade singular, insistia em continuar com ela e estender seu sofrimento.

Ao que os ditos populares mais uma vez se equivocam, e o amor prova ser, mais uma vez, um eterno mistério aos olhos do homem.

Melhor mal acompanhado que sozinho, e Teobaldo não estava nem um pouco mal acompanhado. Sua esposa era mesmo uma beldade. Que mulher!

Gregório Borges

Gregório Borges
Enviado por Gregório Borges em 19/09/2009
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