Na Raça e na coragem.

Vinha em minha direção e vinha certa. Eu sabia o que fazer, e tinha que fazê-lo. Seria uma questão de um instante, rápido e único. A bola vinha em minha direção, queimando, certeira e venenosa. Aproximava-se pronta pra me engolir, desejosa de me derrubar. Não vinha amistosa, não vinha em paz, destinada a provar quem realmente eu era.

Eu estava ali, similar a um alvo. Sem poder sair dali, eu mesmo a tinha pedido. Em verdade, eu tinha ido de encontro a ela, eu tinha desejado aquele momento e agora, ali, não sabia se estava pronto pra encarar. Mas eu teria que estar.

Ela vem e eu entro de cabeça. Ela chega pra me derrubar, e eu venho pra mostrar quem manda. Tonifico o corpo, todos estão ali, esperando minha reação, esperam minha assertividade. O impacto é arrebatador, e o suor se espalha em mil pequenas partículas ao ar, se perdem, arrancados e atirados pela força, pelo esforço. A bola é desviada, e entra. No ângulo! Sem chance pro goleiro. O veneno foi desviado, incontrolável, e o gol, inevitável. Junto explodem o coração, o grito dos que assistiam cada instante daquele segundo. Somos campeões! Ninguém muda mais o que se foi consagrado. Campeões! A profecia se realizava, o guerreiro havia enfrentado o dragão.

Sai pelas ruas, o campeão. Volta pra casa. Se sente campeão. Nem mais, nem menos. Campeão! Enquanto anda pelas ruas olha outras pessoas, cada qual imerso em sua vida, seus problemas, seus sonhos. E era ele, o campeão. Quando de repente, avista algo que turva sua vista. Era ela, que vinha. Sensual, deslumbrante. Venenosa. Certeira e vinha em direção a ele. Ele a deseja. Mas hesita. Não pode entrar de cabeça, não dessa vez. É quase irresistível, todo aquele desejo. Mas o garoto é novo, e sabe. E ela, a pequena que anda na sua direção, coisa mais linda que já viu, olha pra ele e vê: um homem, namoro, casamento, vida, sonhos, amor. Não, ainda não está pronto. Segue andando. Ele é cego não percebe nada daquilo, só o desejo. E segue andando, a vida ainda lhe prepara mil surpresas, e também armadilhas.

Em casa, livros, cadernos em cima da mesa e um universo de informações, que sabe importante, mas nem bem pra quê. Mas, sabe, que ali, mais pesado, mais tenso, também vem queimando, também com força. Não sabe bem se quer encarar. Sabe que ali está o seu futuro. Vacila. O jogo ali é mais pesado, entender tudo aquilo não é tão fácil. Sua mãe, águia que sabe o valor do sacrifício. Não sabe às vezes como lhe fazer perceber. Seu pai, guerreiro, em seu trabalho. É ali onde quer chegar. Sabe o valor de encarar aquele momento, que sempre desejou, sabe que precisa demonstrar seu valor. Não se trata de um lance, de um instante como antes, mas de anos. Tem que carregar no peito, na força, na raça e na coragem. Mas ele sabe. Ele quer, ele consegue. Porque é ele, o campeão.

Gregório Borges
Enviado por Gregório Borges em 29/10/2009
Código do texto: T1894780
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