O OPERÁRIO QUE VENCEU NA VIDA

Ele possuía quase R$ 100.000,00 guardados no banco, mais especificamente na caderneta de poupança. Já quase idoso, aos 58 anos, dizia que sempre poupava para as imprevisões do futuro. Talvez uma doença grave, uma necessidade, vai saber?

Não era rico, mas o salário podia proporcionar-lhe uma boa vida de remediado.

Filet mignon? Não, ponta de acém. Sempre cozido. Um bife de alcatra ou contrafilé, nem pensar. Não gostava de comprar ovos, pois era um desperdício jogar a casca fora. Assim, as plantas da casa estavam repletas, lotadas de cascas de ovos que serviam como adubo.

Aliás, as plantas somente eram aguadas quando chovia.

- Água é um bem escasso. Dizia ele.

No chuveiro, o tempo era cronometrado. Um minuto e vinte cinco segundos. Claro que primeiro abria o chuveiro para rapidamente se molhar. Fechava a torneira para ensaboar-se com sabão de cinzas, feito em casa, e depois se enxaguava com velocidade acelerada.

Detalhe, o chuveiro não era conectado à rede elétrica.

Possuía animais domésticos. Cães.

Estes comiam os restos da comida dos donos. Se por acaso não sobrasse comida, os cachorros comeriam no dia seguinte, afinal, segundo ele, precisavam emagrecer.

Ele também dizia que os cachorros podem ficar até três dias sem comer que não morreriam. Torcia para que tivesse sobras neste intervalo de tempo, pois lhe doía no coração ter que dar comida fresca aos animais.

O carro, que era o seu bem mais precioso depois das casas, já tinha quinze anos de uso. Mesmo assim, o marcador de quilometragem registrava parcos 1.150 quilômetros. Alguns reparos de pintura para fazer, mas ele não se incomodava. O carro estava em melhor estado do que um novo.

Viajava de ônibus e andava a pé em 99% das vezes. Nunca fora a algum lugar diferente de casa de parentes. Dizia que hotéis eram locais insalubres, de gente porca. Não confiava em comer assim em qualquer lugar. Tão forte era crença, que nunca o vi comendo sequer um cachorro-quente fora de casa.

As compras que fazia no mercado eram bem rápidas e eficientes. Nunca comprava um produto por sua boa qualidade, mas sempre os “barbantes” que é o termo que se usa para produtos de segunda linha.

Não lia livro. Jornais também não. Alguma revista, um impresso qualquer não eram por ele apreciados, principalmente porque tinham um preço. Contudo, os tíquetes de supermercado eram minuciosamente examinados por ele.

Com uma caneta na mão, olhava item por item. Orgulhava-se de si mesmo, pois ninguém era capaz de “passá-lo para trás” nem mesmo em um único centavo.

Certa vez, um neto seu ficou muito doente. Realmente, a doença era grave e fatal. O filho desesperado com a doença já havia feito tudo o que podia, inclusive havia se desfeito de sua casa e seu carro para o tratamento da criança.

Só lhe restava enviar o garoto para o exterior para um caríssimo tratamento. O que fazer?

A mãe do menino lembrou que o avô possuía muito dinheiro guardado, então disse ao marido que recorresse ao pai.

- Meu pai? Disse ele.

- É. Teu pai. – Disse a esposa.

Então o filho engoliu a seco e foi até a casa do pai para pedir ajuda.

Depois de ouvir a história do filho desesperado, o pai disse a ele.

- Olhe, eu acho que não vou poder lhe emprestar esse dinheiro, pois ele está preso numa aplicação e eu vou perder muito se retirá-lo agora.

O filho perplexo, responde:

- O que isso, pai, ele é seu neto! O senhor não diz que o dinheiro é para uma emergência?

Responde o pai:

- Pois é, mas eu acho que esse menino nem é seu filho de verdade. Portanto, não vou ajudar alguém que não é da minha família. E tem mais, você é jovem, pode ter outro filho.

Por que tanto zelo com este substituível fedelho?

Frederico Guilherme
Enviado por Frederico Guilherme em 31/12/2009
Reeditado em 07/01/2010
Código do texto: T2004367
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