O rio

Lembro-me do rio de minha cidade. Todos os dias era preciso ir a ele, pedir-lhe a benção, a cidade carecia dele, que generoso doava-se. Água pura, fresca, corrente, água doce, de beber.

Meninas, moças e senhoras casadas ali buscavam água, lavavam roupa, e cantavam, contavam, viviam. Lembro-me do estalar das roupas nas tábuas e depois o enxaguar no rio de minha cidade. Algumas estendiam as roupas em varais improvisados, que mais pareciam bandeirolas a enfeitar o rio.

Na ruazinha que levava até ele, viam-se os rastros dos pingos deixados pelas vasilhas cheias que transbordavam no balançar dos passos e das ancas de quem as carregavam. Depois de um tempo dentro dele, além das roupas molhadas, os pés saiam limpinhos, branquinhos e as mãos engelhadas, que era engraçado só de olhar.

Amizades se formaram e crianças se criarem às margens do rio de minha cidade. Hoje as meninas daquela época são mulheres, as moças já são senhoras com boa idade, e as senhoras já são morridas, assim como o rio de minha cidade.