MATO OU MOTEL

Henrique fez um churrasco no sítio e pediu à esposa para dar carona ao Marcos, um colega de trabalho. Queria estreitar os laços de amizade com quem trabalhava. A esposa se mostrou pronta para atender o seu pedido e apanhou o rapaz no estacionamento do prédio de escritórios, o qual localizava-se num bairro movimentado da cidade.

O sítio ficava a 60 km da cidade. Era necessário trafegar por um pequeno trecho de estrada asfaltada, depois a maior parte do percurso, por uma estrada de chão.

Ainda na estrada asfaltada, já bem entrosados os dois, batendo papo e dando boas risadas, o colega do marido avistou a placa luminosa de um motel na beira da rodovia. Logo se animou, pois conversa vai, conversa vem, ele não desgrudava os olhos dos atributos de Marcela, a esposa do amigo. Bem, vendo a placa luminosa do motel, o rapaz, fingindo admiração, disse:

- Ué... motel por aqui?

- Tem muitos!

Ele se calou por alguns instantes, depois soltou essa:

- Legal! Sabe o que me passou uma idéia pela cabeça? – disse ele, olhando-a mais demoradamente, sem deixar escapar parte alguma do corpo da mulher.

Ela percebeu a insinuação na voz, bem como os olhares, mas disfarçava. Marcela era uma morena bronzeada de praia, bastante inteligente. E nesse dia, trajava um vestido de alcinhas florido, abaixo do joelho, mas que de maneira generosa, mostrava os contornos das coxas. Os cabelos negros, jogados nos ombros, quase escondiam os brincos de argolas. E um batom vermelho delineava os lábios sedutores daquele rosto tenro e juvenil.

- Qual idéia? - perguntou, sorrindo, sem demonstrar muito interesse.

- Que horas começa o churrasco?

- A hora que a gente chegar. Meu marido não convidou muitas pessoas. Acho que só você e mais um casal com a filha.

- Hum... Dá tempo... quer mesmo saber o que pensei? – falou, olhando as pernas dela, ao mesmo tempo em que via o motel cada vez mais perto.

- Diga!

- A gente poderia ir descansar um pouquinho ali. – apontou - Sabe, trabalhei muito hoje. Serviço estressante que o seu marido me dá pra fazer. E você também deve estar cansada. Professora... deve enfrentar uma barra!

- É verdade. Alunos não são fáceis.

- Que acha da idéia?

Marcela não respondeu. Sorriu ligeiramente mais uma vez e continuou dirigindo, calada, sem demonstrar nenhuma reação, mas uns 5 minutos depois, fez um retorno e pegou uma estradinha de chão. Marcos já estava impaciente com aquele silêncio e também com a falta de anúncios de motéis. Agora só se via mato adornando a estrada. E poeira!

- Que lugar esquisito! Estradinha estreita essa!

- É...

- Por que entrou aqui? Você ficou calada desde que sugeri que fôssemos descansar um pouquinho no motel.

A interrogação não serviu para quebrar o silêncio. Ela apenas olhou-o rapidamente e entrou numa outra estrada de terra, mais estreita ainda. Em seguida, parou o carro. E bastante autoritária, gritou:

- Desce!

- O que? Pra que?

- Aqui termina a sua viagem!

- O quê? Você não vai me deixar nesse escuro!

- Pode apostar que sim! E a temperatura aqui, na madrugada, cai drasticamente!

Nesse momento o celular de Marcela tocou. Era o marido. Ela conversou naturalmente, sem tirar os olhos do rapaz.

- Não, Henrique, o Marcos não veio. Passei lá, ele disse que tinha um compromisso, que não podia vir... Ok, amor, tô na estrada, não posso falar muito. Daqui a pouco chego. Beijos!

- Como você é mentirosa! Não sabia que Henrique era casado com uma mentirosa.

- E você fica aí, calado, enquanto entro no carro. Mas fique descansado. Não vou contar nada pro meu marido.

- Se quiser contar, conta... Mas eu ficar aqui, nesse escuro? Tá doida?

- Se tiver algum motel por perto, você pode alugar uma suíte “pra descansar.”

- Era só o que me faltava. Encontrar logo numa sexta-feira uma maluca pra estragar o meu fim de semana!

- Acho melhor você ficar quietinho aqui. Não fique andando escuro. Ouvi dizer que aqui tem onças!

Foi dizendo isso e entrando no carro. Fechou bruscamente a porta e arrancou cantando pneus. A poeira encobriu tudo. O rapaz ficou lá, no breu, desesperado, olhando pra todo lado. Estava apavorado mesmo.

Marcela dirigiu por alguns minutos sozinha, satisfeita por ter se livrado do importuno, mas depois pensou bem e resolveu voltar. Assim o fez. Parou quase junto do rapaz.

- Ainda bem que você voltou... – gritou ele alegremente, correndo na direção do carro. – Já tô sentindo frio...

- Calma. Só vim dizer pra tomar mais cuidado! Ouvi dizer que aqui tem lobos também. Onças e lobos!

- Deixa eu entrar nesse carro, Marcela, por favor!

Ele recebeu como resposta um olhar fulminante e o barulho da chave na ignição, ligando o carro, mas dessa vez pôde ouvir gargalhadas também, porque Marcela saiu lentamente, rindo e abrindo a escuridão da estrada com os faróis altos.