O Suspiro do Sr. Engomadinho

O Sr. Jeffrey era um engomadinho. Não havia um que não dissesse isso. Não podiam deixar de dizer; nem o mais santo. Era impossível, ele era engomado demais, perfeitinho demais. Tudo era perfeito!

Ele estava sempre com o trabalho adiantado, era o melhor aluno de seu curso na faculdade, sempre com as melhores notas, tinha a mulher perfeita, um casal de filhos que todo pai deseja, tinha o melhor salário da empresa, que não fosse o do dono, vestia os ternos mais caros, sempre perfeitamente passados e os sapatos devidamente engraxados, tinha o carro do ano, a melhor casa da vizinhança... Enfim, tinha a vida perfeita, a vida que todo mundo sonha...

Mas, ainda assim, o Sr. Jeffrey era infeliz. Odiava o trabalho, porque o que realmente queria não estava ao seu alcance; nunca amou verdadeiramente sua mulher, só casou com ela porque era a mais bonita; os filhos eram verdadeiros demoninhos que só o infernizavam mais; não conseguia suportar seus ternos, esquentavam demais e o faziam suar como um maratonista; para receber seu invejado salário e manter sua maldita vida de luxo e aparência, tinha que realizar jornadas duplas do seu odiado emprego e trabalhar todos os finais de semana; o cheiro de carro novo era podre para suas narinas, porque não era o carro que queria, era o mais recente lançamento; viver em sua casa era como morar debaixo da ponte, porque não estava do seu gosto, e sim decorada e construída como mandava a moda...

A única coisa de que gostava mesmo e que se esforçava com vontade era a faculdade, que lhe dava algum alívio. Mas a vida lhe fez o favor de dar à turma dele um professor terrível, maldito mesmo, que, amargurado com sua vida, queria ver o pior dos alunos. Esse foi o primeiro sufocamento de seu último suspiro de vida.

Mas a vida, não satisfeita em tê-lo sufocado uma só vez, decidiu dar-lhe outra surpresa desagradável (ou não tão assim): ele havia se apaixonado por uma outra estudante do seu mesmo curso, Anna. Mas ele infelizmente era casado, tinha filhos, uma vida inteira por zelar e ela era casada também, com filhos e tudo, além, é claro, de não demonstrar nenhum interesse por ele. Esse foi o segundo sufocamento de seu único suspiro atualmente.

O seu sonho mais secreto era tornar-se escritor, mais precisamente contista. Por hora, que seus contos fossem publicados na revistinha semanal da faculdade estava bom. Foi então falar com a professora que era a editora responsável pela revista. Mas o mundo conspirava contra ele e decidiu que a diretora deveria ser uma senhora prejudicada há muito tempo pela empresa na qual trabalhava. Assim, misteriosamente, seus contos evaporavam e nunca eram publicados (e nunca seriam, a professora dera a entender certa vez que fora falar-lhe). Esse foi seu maior desgosto e o que sufocou completamente seu tão amado restante suspiro.

Certa noite, quando voltava da universidade, cansado de todos os sufocamentos, o Sr. Jeffrey não aguentou: quando passava em frente ao parque central e mais visitado de sua cidade, a pé, porque não queria usar o carro podre naquela parte, deixando-o um pouco atrás, parou e seguiu para o meio da grama, onde árvores refrigeravam o ar e bancos ficavam à disposição de qualquer transeunte. Lá, quando o relógio marcava altas horas da madrugada, o Sr. Jeffrey suspirou, finalmente: atirou a maleta de lado e gritou como um louco, como Tarzan quando mostrava sua liberdade. Rolou na grama, arrancou folhas de árvores, matos, flores, galhos, cascas de árvores e os comeu. Rasgou a própria roupa engomadinha e gritou mais um pouco.

Ah, como era bom ser livre, livre, livre!! Sem preocupações incômodas, obrigações insuportáveis... Quando se deu conta, adormeceu. Mas ele devia ir, o que os outros pensariam? Mas estava tão bom ali, refrigerante, lavava a alma, ele se sentia renovado, com forças novas, pronto para a vida e, então, adormeceu realmente, acordando pela manhã.

Ninguém o percebeu lá no outro dia, porque ele estava no meio da grama, onde ninguém ousava passar. E quem passava, ignorava. Afinal, era só mais um que enlouquecera e largara a família e o aconchego da casa para trás. Depois de acordado, pegou sua pasta e, indo escondido até seu carro e dirigindo-o depois, o Sr. Jeffrey voltou para casa e para sua vida cotidiana. Afinal, caso precisasse respirar, havia encontrado seu suspiro ali pertinho de casa.

Tiaggio
Enviado por Tiaggio em 28/01/2010
Reeditado em 05/06/2011
Código do texto: T2055975
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