Problemas de condução

Com as facilidades de condução que temos atualmente(se é que temos), ninguém pode imaginar os sacrifícios na década de cinqüenta, quando morava em Inhaúma e estudava na cidade. Forçado a usar duas conduções, salvo se resolvesse enfrentar a fila do lotação, um micro-ônibus de 12 lugares, sem nenhuma segurança e muito caro para a época. Para chegar às 8 horas na faculdade tinha de levantar cedo e ficar na fila a partir das 6 horas ou seis e meia, caso contrário, não chegaria no horário. Muitas vezes, a fila tinha mais de 200 metros; no verão em pleno sol da manhã era horrível a espera. Geralmente as conversas se prolongavam, pois, a maioria se conhecia. Foi assim, que fiquei conhecendo a psicologia dos vendedores de sapatos, pois, uma das amigas da fila era a maior vendedora da Casa Polar. Ela ensinava que o primeiro olhar para quem entrava na loja, era dirigido para os sapatos: má qualidade? surrados? com meia sola? Para esses, os vendedores ingênuos! Depois, um trajeto de meia hora até à cidade se o trânsito estivesse bom, pois, o lotação ia direto, sempre lotado e conduzido de maneira sempre perigosa. Se por economia resolvesse ir de trem, pegava um bonde até Todos os Santos ou Engenho de Dentro, a viagem aumentava de meia hora a quarenta minutos. O grande problema era entrar nos trens superlotados; pessoas viajavam nas portas, como pingentes de altíssimo risco; de vez em quando, um se despingueleava e morria! Certa ocasião, quando eu cheguei à estação de Todos os Santos vi um quadro trágico - oito pingentes tinham caído do trem de Nova Iguaçu, sobre as pontas das grades que cercavam a linha, os corpos ficaram espetados como carne no açougue. Fiquei desesperado, mas prossegui porque não tinha solução. Quando mudei para Vila Isabel, o negócio melhorou porque eu pegava o ótimo bonde Lins Vasconcelos, os melhores carros da cidade, longe dos taiobas de Inhaúma e Engenho de Dentro. Ia direto à cidade, onde seguia o rumo. Mesmo os alunos com mais recursos, não conseguiam táxi com facilidade, havendo até disputa corporal; não era meu problema, pois, não andava de táxi, só vindo a fazê-lo num futuro distante. O retorno de trem era terrível; parecia o estouro da boiada; isso se as pessoas fossem mansas como os bois. Era mais estouro de celerados, com os chamados chinchadores; homens que se aproveitavam do aperto, submetendo as mulheres à prática sexual perversa, sem terem como reagir; se não me engano, o nome vem de chincha, rede de pescar, porque aquelas práticas ofensivas e capitalistas, eram como se fossem uma pesca. Hoje, até no Metro existem carros separados para mulheres, o que significa dizer que o desrespeito continua.