CICATRIZES (EC)
 
  

 
Eu as tenho tantas e tão profundas que me esqueci, por completo, propositalmente. Eu não quero me lembrar. Não gostaria de rememorar todos os acontecimentos que deixaram marcas em minha alma e coração. E que se fundiram, em junção perfeita, como brasa e ferro quente, com o único intuito de ferir o emocional – que, vez ou outra, entra
em pane. Os meus neurônios se chocam, reagem e deletam as dores.
- Não admito parceria com a infelicidade.

 
Cicatrizes são chagas, lembranças dolorosas que tem a

força de um vulcão, descendo, em lavas incandescentes, pela montanha enfurecida. Se deixarmos que esse rio fumegante nos alcance, não haverá por onde fugir – é a morte, na certa.
- A morte da alegria é o fim da motivação.

 
Uma das piores e incuráveis cicatrizes que trago comigo, foi quando, aos 13 anos de idade, fragilizada por uma asma brônquica que me acometia, eu havia sido levada, por meu irmão mais velho, ao médico e, ao chegarmos em casa, notamos uma movimentação estranha na porta – de médicos, vizinhança, parentes. 
- O coração saltava pela boca.
 
Quis fugir dali, pois pressentia a tragédia – já esperada – mas não tinha forças para nada mais. Aproximei-me e, ao tentar entrar em casa, fui contida por algumas pessoas, mas furei o bloqueio e entrei. No quarto, em cima da cama, ainda quente, minha mãe dormia o sono eterno. Acabara de expirar o seu último sopro de vida. Ao seu lado, meu pai, inconsolável, minha irmã mais nova e meu irmão caçula.
 – Que a tudo presenciaram.
 
Sentia-me tão culpada por não estar ali, em seu final, que tive vontade de partir com ela. Eu era apenas uma criança. Esta chaga, a pior delas, atormentou-me por muitos anos. A cicatriz não tem cura, mas a gente vai sobrevivendo e, a melhor maneira de fazer isso, é não dar chance às lembranças ruins, tentar apagá-las da mente para que não se sofra, eternamente.
- A vida continua!





 
Este texto faz parte do Exercício Criativo - Cicatrizes. Saiba mais, conheça os outros textos:
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