O homem invisivel.

Há anos escondia sua solidão num pequeno apartamento...cumpria uma invariável rotina diária.Acordar tomar banho, um café puro, assistir os telejornais da manhã, ler pelo menos dez paginas de um livro escolhido mais pelo volume que o conteúdo para durar alguns meses, sentar-se a frente do computador ver seus e-mails, além de propagandas, correntes e lixos eletrônicos, raros eram os pessoais, alguns mandados por um dos filhos, espalhados pela cidade e pelo mundo ... as 12:15 minutos do seu relógio de pulso, nem mais nem menos, saia para almoçar.

Acontecera um gradual e progressivo afastamento dos seus e dos amigos ... aposentadoria imposta pelo fechamento do negocio lhe rendera um constrangimento como um derrotado pelo sistema afastara-se de amigos e colegas, os filhos cada qual levando suas vidas, foram se distanciando ... parentes, os amigos haviam morrido ou estavam doentes, pelo mesmo motivo dos demais recolheram-se em suas vidas ou foram esquecidos como ele.

Sua solidão ganhara dimensões estranhas, via a todos, mas nenhum o via.Na realidade, inguém o via, ninguém o notava, ate as crianças, passavam sem perceber seus olhos pedintes de atenção, os funcionários do prédio, garçons, atendentes de lojas, visinhos, o cumprimentavam maquinal e burocraticamente jamais perguntando se estava bem ou mal e ele correspondia na mesma moeda, consolidando sua solidão impenetrável.

Chegara a pensar que se ao invés de homem, fosse um espelho, estaria melhor. As pessoas se olhariam nele, para verem a si próprias, mesmo sem vê-lo, seria um olhar direto, coisa que desconhecia e sentia falta .Seus passos mansos percorriam as galerias, exposições, shoppings, cinemas, bares, ruas e becos da cidade que amava, tudo observando e por ninguém sendo observado, nem visto. Não saberia dizer se sua solidão era triste ou cruel, ou se na falta de sentimentos não sentia nem um nem outro, sabia apenas que este tempo os levaria juntos a encontrar a outra face da vida, uni-las e juntos conviverem a derradeira solidão da morte.

Findo o almoço, retornava ao seu refugio, sentava-se na única poltrona da sala, frente a televisão via os jornais da tarde, assistia uma serie ou novela .Até a aguardada noite abrigá-lo em seu manto frio e escuro, olhava as luzes da cidade, prendia o olhar nos demais solitários debruçados nas janelas visinhas vendo a vida passar incansavelmente.

Fazia na pequena cozinha um lanche, escovava os dentes, sentava-se novamente frente à televisão, via os jornais noturnos, dormitava ate que o pendular de sua cabeça o acordasse. Olhava-se no espelho, não vendo nele refletida senão uma pálida imagem de si mesmo... tirava as roupas, dobrava-as e guardava com cuidados de esposa.Vestia um surrado e querido pijama, deitava-se na cama, cobrindo totalmente o corpo magro ate a cabeça independente se escondia da noite e da vida... enrodilhava-se como um feto...dormia e sonhava seus sonhos de velho menino...a espera de mais um dia ... e outro ... e outro...

Carlos Said

Inverno de 2007

Carlos Said
Enviado por Carlos Said em 16/04/2010
Reeditado em 26/08/2018
Código do texto: T2200419
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