Medo de polícia

Quando eu era pequeno, penso que com uns onze anos, morava em uma rua na periferia, já perto de uma estrada que dava acesso às chácaras da região.

E ali passavam carros, carroças de verdureiros, etc. Para entrar nessa estrada, havia uma porteira. Eu, claro, quando ouvia o ruído de motores, ou de carroças, corria para abrir-la e ganhar uns trocados. Quase sempre ganhava.

Mas, logo veio a concorrência. Um garoto de minha idade, vizinho, também ficava atento. Ao ronco de um motor, lá íamos os dois numa louca disparada para abrir a porteira. Quem conseguisse chegar primeiro, abria-a para passarem e com sorte ganhava umas moedas. Essa era nossa rotina, quando não estava na escola.

Em determinado dia, ouvimos o ruído de motor e lá vamos nós, feito doidos na disputa para chegar primeiro e ganhar a gorjeta.

Ocorre que era o carro da polícia. E polícia para nós era sinônimo de cadeia, terror, bicho papão e coisas do gênero. Quando vimos que era ele, viramos nos cascos na mesma velocidade, correndo de volta pra casa, num medo medonho. Não arriscaríamos a nossa pele, nos aproximando do monstro. De longe, às espreitas, com pescoço esticado vimos que o condutor, que estava sozinho, parou, desceu, abriu-a, passou, parou, fechou e seguiu seu destino em direção às chácaras.

Minha mãe que de longe assistiu aquilo se divertia muito, com nosso medo aterrador da polícia.

Mais tarde, quando meu pai voltou do trabalho, ela comentou com ele o ocorrido, rindo muito de mim e de meu concorrente.

Então meu pai me chamou e disse que os policiais não oferecem perigo, não prendem ninguém sem culpa, que são pessoas do bem, que só prendem bandidos, que são nossos amigos, que existem para nos proteger, etc. etc. E como a tal viatura anda não tinha voltado das chácaras, ele disse que eu poderia sim ir abrir a porteira, não teria problema nenhum.

Pouco mais tarde, já quase noitinha, ao som de motor de carro, lá vai eu em disparada para a porteira, na tentativa de ganhar a corrida de meu habitual concorrente, que também já ouvira e estava voando baixo. Ao visualizar quem vinha, era a tal viatura. Meu amigo, claro, voltou nos cascos na mesma velocidade que vinha. Eu, tremendo nas bases, encarei o desafio e seguindo a orientação de meu pai, fui até a porteira e a abri. Depois de ele passar eu fechei-a e fiquei à distância segura, de prontidão para sair correndo, caso ele fosse me prender.

Mas então ele parou e me chamou, pediu que me aproximasse e me deu uma moeda, das mais valiosas do dia. E foi-se embora, me deixando feliz da vida. E em liberdade!

Meu amigo e concorrente, claro, ficou na maior inveja.

Faria Costa
Enviado por Faria Costa em 31/05/2010
Reeditado em 13/09/2013
Código do texto: T2290946
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