QUERO UM CULPADO

Preso pelas amarras do seu próprio destino, está o homem... cuja amargura

Desfigura-lhe a face, triste homem... Confuso e completamente dominado pelas

Circunstância, na sua própria prisão mental, não conseguiu achar uma saída para

Seus problemas, acha tudo insolúvel, tudo muito complicado...

Pobre homem, ele assim o diz...

no seu universo de auto-piedade não enxerga um palmo a frente do nariz...

Não vê que o único capaz de ajudá-lo é ele mesmo, esquece-se disto ao pedir ajuda, aqui e acolá, ele tateia por entre as pedras de seu caminho... pobre homem, ele assim o diz...

Sua vida está completa de dissabores e preocupações, ele quer escapar, mas não vê a saída...

no véu de amargura que lhe cobriu a face, ele se esconde, pobre homem ele assim o diz...

De repente ele cai, dessa vez pensa que não levanta mais... Senti-se fraco e sem forças..., já não é mais um menino, já não quer assim continuar...

Então ele pára, e num momento de rara lucidez, ele vê em suas lembranças os quadros de sua vida... Aquele garoto tão astuto e descontraído brincando de pião e soltando pipa, feliz e leve, sentiu até a brisa desses tempos acariciar sua pele enrugada;

Em seguida viu aquele jovem audaz, cheio de planos e projetos, o céu era o limite para ele, tanto ideais nobres...

em seguida seu casamento...a mulher amada... Seus encantos, seus filhos... o nascimento de cada um, ah...que lindas lembranças!...,

viu-se depois no seu escritório...Dr.Fulano...que orgulho... Como aquilo tudo lhe fazia bem ao ego, enorme ego... Sua ruína...

à medida que as lembranças fluíam, o véu da auto-piedade ia descendo e aos poucos ele ia percebendo e encontrando o real culpado de seus dissabores...

Veio então em meio as suas recordações a imagem daquela mulher, jovem, bela e sedutora mulher, em que num momento de loucura ele se enveredou, apenas um troféu para exibir aos amigos, não podia se quer imaginar o mal que fazia aquelas famílias...

O marido, pobre operário, louco de ciúmes e seus quatro filhos, que ela tinha que deixar com a mãe para trabalhar no escritório, tudo acabado, por causa dele e seu imenso egoísmo;

Lembrou de sua esposa, oh! Pobre dela... Tamanho golpe lhe custou à saúde, vindo depois a falecer de desgosto... Depois que o marido traído a teria procurado e contado toda a traição que sofreram...

Lembrou ainda do olhar do filho mais velho que ao despedir-se do corpo sem vida da mãe, nunca mais lhe dirigiu a palavra...

O remorso lhe consumia como ferrugem ao ferro, já não ia mais ao escritório, este ficou entregue a sócios sem competência, logo fechou... E ele... O que restou dele? Aquilo que se rastejava pelos becos, consumido pelo álcool seu único amigo;

Vislumbrou as palavras de sua Mãe na juventude que lhe diziam: “Filho, nunca subestime o seu livre arbítrio, muitas vezes ele causa danos irreversíveis”, naquele instante ele pôde entender o significado daquelas palavras, que na época não dera muito crédito.

Então ele pôs-se lentamente de pé, e olhou pela primeira vez em muitos anos para o céu, os raios de sol que começavam a nascer entravam pela vidraça quebrada daquele quarto sujo e sem vida, ele passou a mão pelos cabelos desalinhados e num movimento involuntário cobriu o rosto com as mãos e chorou... Ele havia finalmente descoberto o culpado, que tanto buscava para sua vida destruída, até então culpava a mulher que o “seduzira”, o pobre marido traído que após contar a sua meiga esposa do seu infortúnio, matou a esposa infiel e depois se matou, deixando quatro órfãos; Ele culpava o mundo..., mas naquele momento, ele reconheceu que o verdadeiro culpado, era ele mesmo;

E por entre soluços e lágrimas, a única palavra que conseguiu pronunciar foi...

PERDÃO...

klamar
Enviado por klamar em 06/09/2006
Código do texto: T233912