LEMBRANÇAS DO PASSADO - Capítulo XIII

CARO(A) LEITOR(A), ESTE CONTO É ESCRITO EM CAPÍTULOS, PARA ENTENDER A HISTÓRIA, SUGIRO A LEITURA DOS DOZE CAPÍTULOS ANTERIORES. UM ABRAÇO. MARIA LÚCIA.

Em 1945 já estava com doze anos e Natalina com dois, estava muitíssimo parecida com dona Maria. Cheia de vontades e dava os mesmos espetáculos de esterismo quando não conseguia o que queria. Estragou todos os meus brinquedos que guardava com todo carinho, pois a maioria deles quem me dera fora tia Júlia.

Me importava, é claro, com a destruição dos meus brinquedos, não falava nada para não dar atrito, mas um dia cheguei do colégio e minha bonequinha Lili estava jogada na escada. Eu me descontrolei:

- Quem foi o miserável que pegou minha bonequinha Lili?

- Foi eu quem deu para Natalina, mas ela não gostou desta bruxa e a jogou aí. Quebrou alguma coisa? Aliás, não quebrou porque ela é um molambo. - falava dona Maria sorrindo sinicamente.

Peguei minha bonequinha com todo o carinho.

- Por favor, Natalina, não pegue mais minha bonequinha! - referi-me à Natalina, mas com muito carinho.

- Não brigue com ela. Ela pega quando quiser. - dizia dona Maria.

Eu estava caindo na realidade que aquela guerra já estava muito avançada, não adiantava mais nenhuma estratégia.

Fiquei cada dia mais distante de Natalina.

No colégio tinha uma colega, pobre, filha de uma empregada doméstica, o colégio era pago pelos patrões de sua mãe, me dava muito bem com ela. Cecília se tornou minha amiga. Era muito honesta e muito sincera comigo. Nós fomos nos tornando grandes amigas. Ia sempre a minha casa. Recebia a censura de dona Maria.

- Eu não sei o que esta menina pensa, só gosta de gentinha, de empregada doméstica, de filha de empregada, de jardineiro, não pense você que eu não vejo você de conversinha com o João.

- Talvez é porque eles têm alguma coisa a mais que a senhora não tem.

Às vezes eu era mal educada e provocava mais um dos ataques estéricos famosos.

A verdade é que com apenas treze anos, já me via envolvida amorosamente com o jardineiro. João era moreno, cabelos castanhos, olhos meio repuxados, não definida a cor, não sabia se eram castanhos claros ou esverdeados, o corpo bem forte, era alto, um metro e oitanta mais ou menos.

- Cecília, eu acho que estou apaixonada. - dizia meio voando.

- Será possível? Você é muito nova para estas coisas. Eu que tenho dezesseis anos ainda não pensei nisto. - Cecília falava com um tom gozador.

- É sim, me apaixonei pelo jardineiro da casa do Deputado Federal Oscar Calixto.

Rimos muito. Cecília por achar que era brincadeira, mas eu por ser a primeira vez que isto acontecia.

- É sério, Oscarina? - perguntou-me Cecília.

- É sim! É a mais pura verdade, eu não penso em outra coisa, fico doida para chegar os dias que ele trabalha aqui, porque você sabe que ele só trabalha aqui nas quartas e nos sábados.

- Oscarina, não é para colocar coisa na sua cabeça, mas no último sábado ao chegar aqui, ele estava entregando uma rosa vermelha à dona Maria. E dava para perceber que não era como de empregado para patroa.

Ouvi aquilo, acreditei porque era da boca de Cecília.

- Não é possível, Cecília? Será possível? Por várias vezes ele me deu rosas também. Ele é um canalha, tentando conquistar as duas ao mesmo tempo, mas eu sou moça, solteira e ela é casada. Safada! - falava com muita ira.

- Calma, Oscarina, não adianta você ficar assim. Nós temos que arrumar um jeito de desmascará-los.

Cecília foi embora e eu fiquei com minha mágoa. Peguei minha bonequinha Lili:

- Você está vendo, bonequinha, eu estou entrando em outra batalha com dona Maria. Mas só que desta vez eu não vou ganhar nem perder, pois vou recuar. Tenho vontade de falar com papai, mas lembro-me dos conselhos de tia Júlia para nunca afirmar sem plena certeza.

Outra vez ouvi a bonequinha: "Menina Oscarina, você começou muito mal a sua vida amorosa. Vá com calma! Não se deixe enganar, não se iluda por meras rosas e palavras bonitas. Às vezes usa os mesmos argumentos tanto para você, como para sua madrasta. Procure um rapaz mais jovem. O João é muito experiente para você."

Aquilo tudo me indignava, talvez eu fosse ainda muito nova para estar envolvida em tal situação, passando por problemas amorosos.

Na verdade eu era nova, mas muito amadorecida e tinha toda fibra para agüentar uma traição, não de João, pois não havia nada mais entre nós do que alguns olhares, algumas rosas, alguns sorrisos, conversávamos muito, mas não chegamos a nos namorar. A traição era a papai. Sempre li muito e sabia que exista mulheres que não se sentiam satisfeitas com um só homem. Dona Maria antes de casar-se com meu pai era uma mulher de vida livre, isso é claro, não tinha nada a ver, se ela tivesse mesmo mudado o comportamento depois de casada. Papai, coitado, achava que ela jamais teria coragem de trai-lo.

Maria Lúcia Flores do Espírito Santo Meireles
Enviado por Maria Lúcia Flores do Espírito Santo Meireles em 26/09/2006
Reeditado em 26/09/2006
Código do texto: T249762