Cotidiano Tórrido.

Dez de abril, sessenta anos do Miguel. Ouço um foguetório, mas é dos supermercados, anunciando a chegada das verduras “frescas”. Ô dureza!

O populacho vive o caos! Cabeças atordoadas, vidas desregradas. Também, quem quer regra pra seguir?! Há muito tempo, the long, long time, que não leio Fausto Wolf, aquele lobo maldito! Tenho lido somente códigos e leis esparsas, para saciar meu senso de inutilidade para o Mundo.

Não haverá side weis, ou o que quer que seja; nem despedida de solteiro; me despedi há alguns anos. Não haverá manifestações grandiloquentes nem discursos emocionados; nada disso!

Haverá sim “um eu todo retorcido”, comungando o que deve ser comungado, cumprindo para que seja feita a vossa vontade, a vontade do todo, da Justiça Social, para que ao final nada nos faça mal, nem que de nós falem mal.

Sairei como se sai para um dia comum, indo a uma audiência qualquer. Atravessarei a rua com meus passos retos e minhas idéias distorcidas. Sem torcidas uniformizadas, adentrarei ao templo para apreciar seus ornamentos. Lá encontrarei um amontoado a mais de compatriotas a cultuar cada qual suas idiotices. Não me sentirei mal, pois estarei alheio ás suas vontades. Serei o que tiver que ser na hora exata. Assim o fim, o sempre fiz.

Haverá tapetes e cores vermelhas diante meus olhares incrédulos. Seguirei em diante, com um sorriso interno, de quem acabou de sair do inferno para no paraíso adentrar. Algo que não se pode explicitar efusivamente. Entende?

Muitos olhares e a vontade de comer, beber e papear aumentando. A gravata apertada, o peido que saiu liquefeito, aquela vontade terrível de urinar (talvez, entre as pernas, pensando, sem que ninguém o veja, o líquido escorrendo lentamente, numa urinação contida), o descabelo, a má-alimentação, vontade louca de tudo, menos de ficar mais alguns segundos a ouvir clamores que ecoam nos esôfagos dos sôfregos.

O casório é quase que um ato atentatório à dignidade dos incréus. É um teatro em que os inocentes, e as crianças, acreditam ser verdade. “Há santos flutuando por toda parte!”, sussurra uma menininha de seis anos aos ouvidos estupefatos de sua caridosa mamãe. São os chamados delírios da crença patológica, que acometem normalmente crianças e idosos.

Deixando minha cabeça aos ventos, as coisas procedem naturalmente, até que chegue o momento em que se pensa mais livremente. Em templos religiosos o pensamente está vinculado ao culto freqüentado. É antiético, num determinado culto, pensar-se em outra coisa.

Cristiano Covas, santo casamenteiro, 10.04.08.

Cristiano Covas
Enviado por Cristiano Covas em 12/10/2010
Código do texto: T2552198
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