Tempo Perdido

Estavam todos lá.

Felizes, conversavam alto, riam muito se divertindo.

Contavam histórias relembrando os bons tempos de crianças, as brincadeiras, as travessuras.

De longe, o pai os observava em silêncio.

Também estava feliz por ver sua família reunida.

Apesar de sentir muita falta de sua esposa, a presença de seus filhos e netos o confortava, fazendo com que sentisse em seu intimo uma alegria, sensação esta, que deixara de sentir quando sua esposa falecera.

A casa estava cheia de novo.

Era natal.

À distância, ele tentou se lembrar dos momentos de intimidade que passou com seus filhos e percebeu que não havia tido tais momentos.

Percebeu que, apesar de serem seus filhos e de ter vivido a vida toda com eles, ele não os conhecia.

Não sabia nada da intimidade deles.

Seus sonhos.

Seus desejos.

Suas realizações.

Suas decepções.

Não sabia nada.

Neste momento lembrou dos momentos que presenciou sua esposa e seus filhos a conversarem longamente, por tardes inteiras, dias inteiros.

Lembrou também das conversas rápidas e diretas que tivera com eles, tudo se resumindo em “E aí, tudo bem?”, “Tudo e você?”, “Tudo também”.

Agora estavam todos reunidos, conversando entre si, enquanto ele somente ouvia, respondendo somente quando solicitado.

Sua vida fora dedicada ao trabalho, construiu uma vida confortável para si e sua família. Fez tudo o que se esperava de um bom pai de família, no entanto, naquele momento, viu que esquecera dos relacionamentos inter pessoais.

Naquele momento, percebeu que seu relacionamento com os filhos sempre foi frio, sem vida. Sem qualquer tipo de intimidade.

Ao ver sua família reunida sentiu o peso de suas atitudes, involuntárias, mas atitudes que prejudicaram muito a ele e a seus filhos.

Naquele momento, tomou uma decisão, sabia que era tardia, mas não importava.

Tinha que mudar a situação que estava vivendo.

“Onde já se viu, um pai não conhecer seus filhos”. Pensou.

Não tinha dúvidas quanto ao amor de seus filhos, que o amavam incondicionalmente, mesmo com seus defeitos, que não eram poucos, e suas limitações, afinal ele era o pai, o pai que os criara, que lhes dera abrigo e proteção, que lhes dera um futuro, um pai que, mesmo do seu jeito os amava.

De repente, veio a sua mente a ultima frase de sua esposa, antes de morrer.

“Cuide das crianças”.

Era isso que iria fazer, mas para isso ele teria que mudar de vida, mudar a sua postura perante seus filhos e netos.

Nesse momento ele precisava de coragem.

Coragem para mudar não só a sua vida, mas, também, a vida de seus filhos.

Olhando os filhos, respirou fundo e foi na direção deles e olhando um a um nos olhos, disse:

- Muito prazer! Sou o pai de vocês. – todos ficaram assustados com a atitude do pai – Sei que durante esses anos todos fui somente uma figura ilustrativa na vida de vocês, por isso estou aqui para pedir-lhes desculpas, desculpas por tudo que fiz vocês passarem, desculpas pela minha ausência, pela minha falta de sensibilidade para ajudá-los nas muitas vezes que precisaram.

- Papai!

- Por favor! – interrompeu o pai – Sei que errei, mas quero me redimir. Eu amo vocês e sempre vou amá-los, sempre. Mas hoje, eu quero começar a participar da vida de vocês, quero conhecê-los e quero que vocês me conheçam também. Quero saber tudo sobre as suas vidas. Tudo.

Um clima de emoção tomou conta de todos, que se abraçando, choraram muito.

Marc Souz
Enviado por Marc Souz em 24/11/2010
Código do texto: T2633660
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